quinta-feira, outubro 30, 2003

Metabloguismo (1)


O que motiva um blogger? Essencialmente comunicar, penso. É extraordinário procurar algo na Internet, qualquer que seja o assunto já alguém se debruçou sobre ele e perdeu pelo menos algumas horas a fazer uma web-page. E para quê? Talvez só na esperança de pelo menos uma pessoa a ler.

Talvez a maior ânsia do ser humano seja mesmo comunicar, e não o sucesso, a vitória, a riqueza ou o progresso. Querem-nos vender as novas tecnologias mostrando que têm algo que as anteriores não tinham. Mas isso não cega. O sucesso das SMS é paradigmático. As mensagens de telemóvel utilizam recursos normalmente desperdiçados, mas por isso são limitadas, apenas se pode enviar umas palavras. Que sucesso poderia ter isto? Muito pouco, pensava-se há uns anos atrás. Mas esqueceram-se que mesmo umas escassas palavras permitem comunicar. E a comunicação, bem vistas as coisas, é o que de mais perto temos de um milagre. Não era à toa que povos antigos consideravam a linguagem uma dádiva dos deuses.

O blogger é um comunicador. Muitos são os colunistas dos seus próprios jornais, pretendendo substituir-se ou estar em pé de igualdade com aqueles que escrevem nos jornais “a sério”. E na verdade, a blogosfera vem a revelar-se na fonte de informação mais preciosa que temos. As filtragens são menores, não há tanto jogo de influências. Obviamente que um blogger dificilmente é totalmente imparcial. Mesmo que apenas diga aquilo que lhe pareça verdade, é quase sempre guiado por aquilo em que acredita, tendo uma tendência natural a esquecer as alternativas. Mas sabe que escreve para um público exigente, que o pode confrontar e pedir melhores explicações, provas, uma argumentação sem rodeios.

Mas é bom ter a noção, quanto antes, das limitações de um blog. Atenda-se ao caso do Abrupto, o blog nacional de maior audiência. Durante os vários meses de existência deste blog, foi consultado cerca de 300 mil vezes. Mas basta Pacheco Pereira ir uma vez à televisão para ser visto por um número de pessoas superior. É certo que as pessoas que lêem blogs terão um poder influência muito superior à média, mas por mais sucesso que um blog tenha, a esmagadora maioria das pessoas nunca o consultou e talvez nem faça ideia do que seja.





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terça-feira, outubro 28, 2003

Máquinas ao volante


Parece-me em muitas ocasiões que as pessoas ao volante mudam de natureza ou talvez até a percam. Mais do que se transformar num “assassino nato”, o indivíduo evidencia perder todo o seu ser e entrega-se à máquina. Uma entrega de tal forma consumada que se sente máquina. Com mais ou menos arrogância, o indivíduo ao volante sente ter os poderes da máquina, que é ele que acelera, trava, vira – e não apenas o que dá o comando. Sente também a invulnerabilidade da máquina, o desconhecimento da dor por parte dela, a ausência de medo.

E o indivíduo ao volante também não vê o outro indivíduo em outro volante como uma pessoa. Vê apenas outra máquina. Irrita-se se ele vai lento, aquela máquina não pode ser lenta!, ignorando as vontades humanas por detrás, se é um idoso, alguém sem pressa. O automóvel não é apenas o território, é uma extensão de nós ou nós uma extensão dele. Conseguirão todos os apelos e todas as campanhas rodoviárias romper este laço afectivo com a máquina?





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quinta-feira, outubro 23, 2003

Que coisa é essa do MBA?


Andam a perguntar-me que movimentações são estas no blog, em que num repente foram acrescentados links de outros blogs, numa união que foi mudando de nome. A ideia é muito simples, trata-se de promover a solidariedade entre alguns blogs que, penso, estavam injustamente esquecidos. E isso faz-se com a mútua referência.

Com algum espanto meu, quase todos os convites efectuados foram aceites. Entretanto, mais dois blogs mostraram interesse em fazer parte do grupo, que actualmente é composto por 9 elementos. Os resultados, em termos de audiências, são óbvios. As audiências diárias deste blog mais que duplicaram, e os dados do contador “Bravenet” mostram que boa parte dos acessos são efectuados a partir de outros blogs da união.

Inicialmente foi proposto o nome UBM – União de Blogs Modestos. As primeiras reacções não foram muito favoráveis, tendo sido proposto em alternativa IBM – Interesting Blog Movement. Também não reuniu consenso, especialmente por ser em inglês. Em reacção, alguém sugeriu algo bem português, BROA - Bloggers Rebeldes Opinam Aqui! Para tentar ainda aproveitar a sigla IBM, foi sugerido passá-la para português, como Irmandade de Blogs Misteriosos (ou Mal-entendidos, Maledicentes, etc). Entretanto, alguns manifestaram-se a favor de UBM, tornando a coisa um pouco caótica. A última proposta de nome foi MBA – Movimento Blog Alternativo, tendo sido a que reuniu maior consenso e actualmente consta em 6 dos 9 blogs.


Ainda estamos longe de saber se este movimento poderá ser algum dia um case study de metabloguismo. No que me diz respeito, quero analisar nos próximos tempos o conteúdo dos outros blogs a fundo, e se todos fizerem um pouco isso, talvez se gere aqui alguma dinâmica de grupo espontaneamente. Tudo é diferente quando ainda se está no tempo dos pioneiros.





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quarta-feira, outubro 22, 2003

Portugal na nova e na velha Europa


Ao contrário do que se pensa, Donald Rumsfeld é uma das pessoas menos influentes na administração Bush. Não só as suas opiniões intervencionistas têm pouca adesão nos outros membros da administração, como dentro do pentágono a sua posição é muito mal aceite pelas principais chefias militares. Mas apesar disso, Rumsfeld conseguiu mexer com e ego europeu, falando nas duas europas, a nova e a velha. A forma indignada com que esta distinção foi sentida só lhe deu mais visibilidade, para não dizer força. Mas tendo sido proferida num momento quente da cena internacional, a velha Europa ficou como sendo a anti-americana e a nova Europa como sendo pró-americana. Mas mesmo esquecendo os americanos, talvez tenha ainda sentido fazer esta separação, apenas conceptual, entre as europas.

A velha Europa não deveria ser vista como algo depreciativo. Pode-se considerar que um país da velha Europa tem uma longa história sem interrupções de soberania, atingiu um alto grau de desenvolvimento, possui uma riqueza a todos os níveis, especialmente no cultural. Mas é também natural que esse mesmo país não tenha grande vontade nem energia para fazer mais e melhor, achando-se ter atingido o nível imediatamente abaixo da perfeição, e o estatuto de já não ter nada a aprender com ninguém. Daqui nasce também um espírito invejoso, disfarçado de elevados princípios morais, uma total falta de aptidão para situações novas que não estejam totalmente sob controlo e um condicionalismo moral sobre quem não alinha a roçar o totalitarismo. Ironicamente, esta velha Europa, após ter sido guiada pela direita retrógrada é agora consolidada pela esquerda radical. Todos querem manter o cadáver vivo por mais algum tempo.

Não é muito compreensível que Portugal queira fazer parte desta velha Europa, mas é o que acontece. Temos uma mentalidade que se voltou a fechar, temos um profundo horror à mudança, ninguém tem energia, e as novas gerações moralizaram-se no pior sentido do termo, apenas numa arrogância que deriva de uma pretensa superioridade. Mas a única semelhança que partilhamos com outros países da velha Europa é a longa história, não há o desenvolvimento, não há a riqueza. A Portugal faltou viver quase todo o século XX, por isso, deveríamos querer fazer parte da nova Europa, da que ainda se quer desenvolver, que quer experimentar coisas novas, que é criativa, que tem vontade de viver. Não devíamos querer extinguirmo-nos já em conjunto com os outros países da velha Europa, não fazemos parte do mesmo ciclo. Não acreditamos em nós, preferimos desistir fazendo e conta que estamos bem acompanhados no seio de uma requintada Europa. É pena, o extraordinário potencial dos portugueses podia ainda dar muito que falar no mundo.





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segunda-feira, outubro 20, 2003

"Fast-Writing"


A Caixa de costura chama ao Sobre tudo e sobre nada Fast-Writing, por achar que é utilizado aqui o conceito de fast-food adaptado aos blogs.





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Telivisão é cultura


Houve um tempo em que o povo dizia que a televisão era cultura, a altura apenas a RTP. Muitos pais, que não tinham tido acesso a meios de informação e conhecimento, viam na TV uma forma dos seus filhos irem mais longe que eles, ficarem mais cultos. Era uma visão ingénua, de esperanças nesse exterior (TV), mas talvez com algum fundo de verdade.

Com o nascimento das televisões privadas, a ideia da televisão como cultura desapareceu completamente. A TV passou a ser espectáculo fácil, desprezo pelos rituais (o anterior cumprimento dos horários por parte da RTP era como que um ritual para as pessoas), afastamento da realidade, xarope emocional.

Com o aparecimento da TV por cabo, a “cultura” voltou em força. Canais como o Arte, Odisseia, História, National Geografic, Mezzo, Peopel and Arts, BBC Learning, já deverão ter apresentado nestes anos mais documentários, programas culturais, científicos, etc. que a RTP ao longo de dezenas de anos.

Mas agora será tarde demais. A generalidade das pessoas já não passa sem a medicamentação diária dos canais generalistas, não tendo paciência para algo mais – é essa nossa cultura.





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sexta-feira, outubro 17, 2003

Sobre o deserto


Agradecimentos ao Voz do Deserto. O autor, a respeito do post sobre o sentido da vida, comenta:

Apesar de ser possível nos atermos perante algumas questões que nascem das suas linhas, talvez concorde que a vida não necessita ou possui um significado. O significado é que precisa de nós.





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quinta-feira, outubro 16, 2003

Mussolini é meu vizinho, Estaline foi colega de trabalho


Desiludam-se os que acham que vou aqui divagar por teorias da conspiração.

A falta de naturalidade com que se fala dos ditadores é assustadora, porque muitas vezes esconde admiração. Fala-se dos tiranos deste mundo como se tivessem uma natureza diferente, como se não fossem pessoas como as outras. Isto serve para exacerbar os horrores cometidos, para os evitar, mas sem sucesso. As ditaduras nascem quando há condições sociais para isso, e há um fantoche que assume o papel de líder.

Mas descrever o ditador de forma quase sobre-humana, com uma mentalidade diabólica, é perigoso, porque o Diabo é forte e o que é forte atrai. Talvez o poder seja a chave da questão, porque corrompe e, se for absoluto, corrompe absolutamente.

Mas aqui vou discordar. Vou dizer que o poder, ao invés de corromper, revela a corrupção. O poder é a janela que dá a ver aquilo que a pessoa já pensava, desejava e talvez ansiava. O poder não dá nada à natureza da pessoa.

Pode ser desanimador ver isto assim. Era mais fácil pôr as culpas em algo exterior ao ser humano. Mas quantas pessoas comuns, amigos nossos talvez, dizem que, se fossem elas a mandar faziam as maiores barbaridades, muitas vezes implicando morte e destruição. E fazem-no sem nenhum pudor. Pensamos que não é a sério, que é só um desabafo ou uma ânsia momentânea de protagonismo. É uma desculpa que também serve para nós porque, afinal, podemos ser os corrompidos…





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terça-feira, outubro 14, 2003

A heresia de falar sobre o Big Brother (3)


O QUE TEM ESTE BB A MENOS QUE OS OUTROS?

Saio do trabalho, fim de tarde, e deparo, no outro lado da rua, com um outdoor. Trata-se dos participantes do BB4. Cada um deles foi fotografado em separado e depois efectuada uma cuidadosa montagem. A iluminação cautelosamente escolhida, não existem sombras rígidas, todos ficando com um tom de pele idêntico, bronzeado e atraente.

O BB4 tem um novo formato, mais intriguista, visualmente mais atractivo. Mas o sucesso não é o esperado e, em consequência, vai ficando relegado para depois da meia noite, após as abomináveis telenovelas da TVI. As pessoas acham o programa diferente, os concorrentes menos interessantes, mas o que terá mudado? O que realmente mudou foram os espectadores. A experiência básica de cada participante não se altera muito. Quem apenas se interessava pela intriga sai desiludido, as possibilidades a este nível são limitadas e tudo se parece repetir de alguma forma. Desilusão também foram as prometidas cenas escaldantes – como se isto pudesse ser novidade numa TV cheia de sexo.

Por incrível que possa parecer, este BB só é realmente interessante para dois tipos de pessoas: Os muito broncos, que comem tudo o que se lhes ponha à frente; ou então os mais sensíveis, que conseguem apreender a alma humana em cada pequena coisa que acontece.





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segunda-feira, outubro 13, 2003

Como lhe correu o dia?


Hoje, ao início da noite, fui buscar um casaco à lavandaria. À minha frente estava um casal com bastante roupa para depositar e com mais dúvidas ainda. Levaram uma eternidade, e quando se foram embora, a senhora que os atendia ainda demorou mais tempo tratando da roupa deles, etiquetando-a, dobrando-a. Para mim era mais conveniente ser logo atendido, mas percebi que tal ia quebrar o fluxo de trabalho da senhora e se estivesse muita gente à espera poderia se gerar ali o caos e a roupa sair trocada. Mas com tudo isto passaram quase 10 minutos. Não desesperei. Em vez disso, fiquei atento ao que faria a senhora, se me iria pedir desculpa por ter esperado e sorrir-me. Nada disso, de uma forma fria e alheada recebeu-me o talão e deu-me o meu casaco.

Este episódio é tão corriqueiro que parece absurdo estar a mencioná-lo. Mas é um questão mais importante do que possa parecer à primeira vista. Porque se, depois de toda aquela espera tivesse recebido um pedido de desculpas e um sorriso, imediatamente todo o pretenso aborrecimento se teria desvanecido. E são pequenas coisas como esta que, somadas ao longo das horas, nos dão a sensação de o dia ter corrido bem ou mal. Isto vai contra aquilo que as pessoas acham, pensando que um bom dia é quando lhe acontecem coisas extraordinárias e um mau é quando alguém os aborreceu ou se chatearam com alguém. É claro que isto também conta. Mas pequenos gestos são muito importantes, como dar ou receber a vez numa fila de trânsito, receber um sorriso de alguém desconhecido, ou então ver a beleza que tantas coisas têm.

Para isto é preciso estar atento, tanto para melhor aproveitar pequenas coisas boas que vão acontecendo e também para superar ligeiras adversidades, sem ficarmos apegados a elas.





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sexta-feira, outubro 10, 2003

Por caminhos politicamente incorrectos (3)


INOVAÇÃO, EMPRESAS E CONTRAPONTO

Inovação é a palavra de ordem hoje em dia. O Presidente da República falou nisso, o Primeiro Ministro também, os administradores das empresas também falam e os directores de departamentos insistem. As empresas têm que inovar.

Mas continuo o meu contraponto com uma citação de um compositor holandês de nomeada, que penso ainda ser vivo: «A inovação como ideologia, tal como o conservadorismo, é um sinal de estagnação.» Relembrando que no contraponto duas ou mais linhas melódicas, apesar de completamente independentes, contribuem para o todo musical de forma harmoniosa.

Voltando à primeira linha melódica, é inegável que as empresas portuguesas necessitam urgentemente de inovar, nem que seja por uma questão de sobrevivência, não por serem conservadoras mas porque nunca o foram. Na realidade, nunca existiu uma estratégia para as empresas, mas apenas uma manutenção à tona de água, uma sobrevivência artificial, tal como o doente terminal é mantido vivo pela máquina. Para as empresas, a máquina é a fuga aos impostos, o proteccionismo, os baixos salários, subsídios contínuos – tudo coisas em vias de extinção ou que o deveriam ser.

Mas para onde nos leva o progresso económico, consequência da inovação? A Irlanda é um bom exemplo. Era um dos países mais pobres da Europa e actualmente um caso de sucesso económico fulgurante, exemplo a seguir. Curiosamente, ou talvez não, uma das peças de teatro com bastante sucesso nos palcos britânicos baseia-se no saudosismo da velha Irlanda, pobre, dos verdes campos, e olhando criticamente para o presente e os seus novos problemas. Não é só por cá...





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quarta-feira, outubro 08, 2003

Por caminhos politicamente incorrectos (2)


O SENTIDO DA VIDA

Finalmente encontrei a resposta para a Rainha das perguntas: Qual o sentido da vida? Bebendo inspiração dos maiores mestres espirituais, numa busca terrível e sem compromissos, a resposta apareceu: A vida não tem qualquer sentido! Tal como não sentido perguntar para onde vamos e de onde viemos.

Mas esta descoberta longe de ser decepcionante é, bem vistas as coisas, muito excitante. Porque o que se torna importante é dar à vida o sentido que ela não tem, e assim podemos criar. Talvez a origem da criatividade seja a falta de sentido das coisas. Evoluída é a pessoa que cria sem dogmas

É a falta de sentido da vida que a torna interessante.





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terça-feira, outubro 07, 2003

Por caminhos politicamente incorrectos (1)


HOMENS E MULHERES

Quando li pela primeira vez a famosa citação de Freud, dizendo que nunca havia conseguido compreender as mulheres, quase tive pena do senhor e da sua ignorância. Na altura pensei que já sabia muito do assunto e pouco me faltava para descobrir. Passados mais de 10 anos dei-me conta que, afinal, também não compreendo as mulheres. Todas as brilhantes conclusões que tinha foram sendo abaladas, esquecidas, postas de lado. E assim fui-me juntar a tantos homens, uns conformados, outros ainda esforçados.

Mas isto é só metade da história. Porque também me vim apercebendo que as mulheres também não compreendem os homens. Só que não se preocupam com isso, não tentam nunca perceber o porquê. Algumas simplesmente seguem em frente como se isto fosse uma não questão. Outras desvalorizam-na de uma forma subtil, repetindo em estereótipos que não dizem nada mas são eficazes (Os homens são todos iguais, só pensam na mesma coisa, etc.).

Há algum desequilíbrio nesta mútua incompreensão, porque aos homens é muito mais censurada a ignorância, o não perceber a outra parte. Às mulheres não é exigida grande coisa, porque o que é politicamente correcto é exigir direitos para as mulheres de agora e assim compensar os direitos que as suas mães e avós não tiveram.

Nós, homens, já percebemos que as mulheres dominam cada vez mais em quase tudo. Rezemos que ainda leve algum tempo para elas descobrirem que nos siderarão completamente quando começarem a exigir deveres e responsabilidades. Estarão os nossos filhos machos condenados apenas a realizar trabalho braçal ou então serem escravos sexuais e donos de casa? Talvez não fosse assim tão mau…





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Os estudantes do Técnico


Apenas um comentário meu publicado no Abrupto:

É frequente aparecer na comunicação social notícias do género "Os estudantes do Técnico manifestaram-se contra...". É um abuso de linguagem. Tirando algumas raras ocasiões em que de facto há uma mobilização apreciável, em geral os referidos "estudantes do Técnico", não passam de algumas dezenas num universo de aproximadamente 9000 estudantes. Muitas vezes fui surpreendido, tal como vários colegas meus, por apenas ter sabido de tais manifestações pelas televisões, porque o seu impacto no interior do Técnico é quase sempre nulo.

E chamar aqueles jovens de estudantes é também um pouco abusivo. Porque em geral os estudantes encontram-se muito ocupados nas salas de aula, nos laboratórios, bibliotecas, estudando, fazendo trabalhos, relatórios, tirando fotocópias, etc. Aqueles jovens são, muitos deles, estudantes com um estatuto especial, que podem andar o ano inteiro em festas por todo país, teoricamente em representação da instituição. Podem fazer isso porque para eles existe uma época especial para a realização de exames, realizada mais tarde, em que as provas são tipicamente mais fáceis. A época especial de exames apenas deveria ser dada em casos excepcionais, mas é utilizada abusivamente por estes estudantes, que não apenas têm exames mais fáceis mas muitas vezes se isentam de apresentar trabalhos ao longo do ano em várias cadeiras. Isto quer dizer que podem apresentar as mesmas notas que outros com 1/10 do trabalho!

Mas estes estudantes, nem com tanto tempo livre o aproveitam para se cultivar um pouco. Não sabem que o Técnico não foi criado à imagem da Universidade de Coimbra, mas mais como a sua antítese. E não vou aqui escrever o que disse Voltaire sobre a Universidade de Coimbra por respeito à instituição. Houve uma altura em que chegaram a colocar uma capa negra na estátua de Duarte Pacheco, sem se aperceberem da barbaridade que cometiam. Mas uma coisa é certa. Estas manifestações, apesar de não serem minimamente representativas, conseguem ser bastante efectivas na comunicação social - nada é fruto do acaso.





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segunda-feira, outubro 06, 2003

A dura realidade dos números


Há uma semana atrás foi colocado um contador neste blog. Desde então, por mais de 70 vezes foi visitado, numa média muito aproximada de 10 pessoas por dia. O dia mais visitado foi a última sexta-feira, 3 de Outubro, com cerca de 22 visitas, e o menos visitado a terça-feira anterior com apenas 4 visitas. O período mais visitado encontra-se entre as 10h e as 11h da manhã (chegada ao emprego), seguido do intervalo entre o meio dia e as 13 h (quando os outros vão almoçar) e em terceiro lugar o período entre as 22h e a meia noite (para tirar o stress das telenovelas).

São números modestos, mas ainda assim intrigantes. Porque de facto situam-se acima do que esperava. Contava apenas com uma média de 4 ou 5 visitas diárias – todas de pessoas a quem eu exerço uma chantagem cruel e que não tem meios de se esquivar. Resta saber quem são os meus outros 4 ou 5 leitores masoquistas.





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domingo, outubro 05, 2003

O sexo e a mentira


Estava eu a fazer zapping num destes fins de semana, quando deparo com o programa “Sexappeal”, emitido pela Sic escandalosas horas da noite. Chamou-me a atenção um questionário sobre sexo. Não era um questionário de rua mas de centro comercial, talvez um local considerado mais erótico. Foram entrevistadas cerca de 10 pessoas sobre duas questões muito simples.

Primeiro perguntaram o que era um 69. Todos deram a entender que sabiam o que era, mas apenas dos inquiridos referiu explicitamente que dizia respeito a sexo oral. Fiquei um pouco surprrendido com isto, porque actualmente está na moda as pessoas fazerem-se passar por muito liberais em relação ao sexo, e que são muito activas e iventivas, mas depois não conseguem falar das coisas em concreto, de forma simples mas apenas com meias palavras.

Depois, perguntaram como era a posição do missionário. Pensei que era uma pergunta básica demais e que qualquer adolescente sabia a resposta, mas aqueles adultos não. Boa parte disse nunca ter ouvido falar. Outros diziam que, tal como o nome indicava, nessa posição uma das pessoas estava de pé e oura de joelhos (supostamente a rezar). Ainda mais surpreendente foi uma das respostas, algo do género: «Então a posição do missionário é a única aceite pela Igreja. É por trás...»

Esta sucessão de respostas atabalhoadas e surpreendentes pode ser cómica. Mas a ignorância e a dificuldade de falar sobre sexo são também sinal de atraso cultural. Muitas pessoas nao se interessam minimamente pela verdade, preferindo fazer associações fáceis e nunca dar o braço a torcer. Não percebem que isto também é mentir?





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sexta-feira, outubro 03, 2003

A Crítica como sinal de ausência do Sentido Crítico


As recentes notícias sobre o uso abusivo do helicóptero em Lamego e do alegado favorecimento da filha de um ministro por outro na entrada em Medicina, são bem exemplo da mentalidade portuguesa. Estes casos devem ser esclarecidos e as responsabilidades assumidas. Mas daí a tornarem-se escândalos nacionais, que fazem esquecer tudo o resto, onde são sempre exigidas demissões e mais demissões, parece-me de um ridículo atroz.

Porque ao dar uma importância excessiva a estes casos, isso passa a ser um atestado de esquecimento face aos problemas realmente graves. A desculpa é sempre a defesa da ética e dos valores. Mas que importância têm umas viagens de helicóptero face à corrupção de uma câmara que leva a uma desastrosa organização do território, influenciando a vida de milhares de pessoas que têm que viver em lugar feios, sem espaços verdes e de lazer, sem creches, com deficientes acessos? Que importância tem um favorecimento pontual face aos crimes contra o ambiente, os animais, as crianças ou idosos? Estas comparações são ridículas e nem deviam ser feitas, mas a partir do momento em que assisto a uma condenação pública igual para casos tão díspares, ela passa a ter sentido.

Os portugueses não são realmente exigentes com os políticos, começando por serem pouco exigentes consigo próprios. Isto, aliado a uma falta total de sentido crítico, dará resultados explosivos, ou pior, poderá não dar quaisquer resultados. Não me interessa muito agora explicar se isto se deve a debilidades emocionais, ou a 50 anos de salazarismo, ou à inquisição. Já é mais que tempo de abrir os olhos e ter coragem para mudar. E isto é para todos, porque vejo nas classes mais favorecidas e com mais instrução a mesma flacidez de espírito, mas expresso de forma mais polida.

Alguns comentadores mais lúcidos já alertaram para os perigos da falta de sentido critico dos portugueses em relação aos políticos, sempre com os velhos clichés de que os políticos são todos iguais e são estão na política para se favorecerem a si e aos amigos. Com isto esquecessem que há muitos políticos que são honestos e competentes e que ao entraram na política abdicam de avultados ordenados em empresas privadas, para passarem a ganhar apenas uma fracção disso. Mas durante quanto mais tempo irão estar estas pessoas disponíveis para a vida política, sabendo que terão insultos permanentes?

Mas quando estas pessoas capazes saírem, os lugares estarão imediatamente ocupados. Os candidatos naturais são os membros das juventudes partidárias, habituados a jogos políticos fúteis, sem sentido crítico e com total desconhecimento da vida real e naturalmente incompetentes, mas mestres da ilusão e da eloquência.

É isto que irá acontecer se os portugueses não abandonarem a crítica fútil e se esforçarem por ter um real sentido crítico, tentando sempre discernir as diferenças entre o essencial e o acessório, e saberem quando têm de ser firmes. Precisamos todos de uma nova educação emocional.





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quinta-feira, outubro 02, 2003

O ginásio dos puros


Psiquiatras, psicólogos e psicanalistas cuidem-se! A cultura física parece estar de volta, agora é o ginásio a nova moda. Começa a ser uma falta de estatuto social não ir ao ginásio regularmente. Também as práticas aparentemente mais espirituais parecem estar em alta: Yoga, Tai Chi, artes marciais, modalidades recentes que misturam, p.e., Karaté música e dança. E também práticas ao ar livre de todo o género, desde as chamadas radicais às mais clássicas, têm cada vez mais adeptos.

Será que a cultura do centro comercial, fast food, sofá e comando de TV está a chegar ao fim, para dar lugar a uma cultura física mais saudável? Talvez, mas nem sempre as mudanças são no sentido que parecem apontar. Esta nova cultura física parece-me pouco natural, as pessoas têm necessidade de falar do seu ginásio frequentemente, como se o mais importante fosse o aspecto social. E por trás do aparente entusiasmo que revelam por palavras, pelos seus actos, atitudes e expressões, as pessoas parecem-me tão apáticas e com tanta falta de interesse pela vida como sempre.

O ginásio não dá um sentido para as práticas físicas, é tudo demasiado orientado para os resultados exteriores. É o chamado exercício burro, em que a pessoa não está bem consciente de si mesma e sem essa consciência os ginastas não vão passar dos mesmos “débeis emocionais” de sempre. Por outro lado, há aqueles que se agarram às práticas “mais espirituais” e lhes tentam dar sentidos grandiosos, mas completamente irreais. Os charlatões ganham mercado, com promessas aliciantes, enquanto os professores honestos acabam por ser abandonados pelos alunos por não dizerem aquilo que se quer ouvir.

Resta saber se esta cultura física irá beneficiar o corpo e também a mente, como diziam os antigos gregos, ou será apenas mais uma fonte de distúrbios emocionais. Neste último caso, vai haver ainda mais trabalho para psiquiatras, psicólogos e psicanalistas.

Ainda sobre esta temática, um pequeno apontamento histórico. Hitler era vegetariano, adepto da cultura física e da vida nas montanhas, um puro que chegou a ser considerado homem do ano pela revista Time. Churchill era um bebedor, fumador de charutos (até que um modelo ficou com o seu nome), um impuro, bastante insultado no seu tempo, de forma semelhante ao que acontece actualmente com Bush. Actualmente Churchill é considerado um dos maiores estadistas de sempre e a pureza de Hitler foi aquilo que sabemos.





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quarta-feira, outubro 01, 2003

Notas sobre humor (3) – Gatos e televisão


Seria injusto não aludir ao Gato Fedorento como uma referência sobre o humor na blogosfera portuguesa. Utilizando uma linguagem acessível, e procurando sempre o pormenor que a todos passa despercebido, o Gato Fedorento usa um humor delicado, por vezes penetrante e levemente sarcástico. Tenho um palpite que os autores gostam de ser reconhecidos como inteligentes, cultos e, implícito nas tiradas humorísticas, sensíveis.

Gato Fedorento, também em vias de se tornar uma referência na TV, um meio mais complicado. Se o humor é muito bom ninguém percebe. Ninguém vê as séries inglesas que passam na RTP2 sábado à noite. E apesar de muito se ter falado no Seinfeld, apenas umas elites acompanharam a série. Herman já há muito desistiu de fazer coisas com mais nível porque sabe que não teria público.

O humor na TV, para o grande público, vê-se limitado a programas como "Os Malucos do Riso" ou “As Lições de Tonecas”. Começaram a revelar-se os primeiros interpretes de Stand up Comedy no "Levanta-te e Ri", a tardias horas na SIC. O formato vai um pouco mais longe que o simples contar de anedotas, algo que Artur Agostinho fazia na TV há 40 anos atrás, mas maior parte dos intervenientes não sabe a diferença entre ter realmente piada e ser engraçado frente aos amigos.

A Sic Radical está vocacionada para o humor. Tenho pena de não já não passarem séries de animação japonesas, que têm um humor que acho de completo. Mas as jóias da coroa fazem o que podem. O "Cabaré da Coxa"” vive bastante do talento e inteligência de Rui Unas, num cenário exíguo e informal, onde se liberta o ímpeto sexual do homem comum, tão censurado em outros locais. "O Perfeito Anormal" parece-me ser um formato de eterna experiência, e daí já resultaram dois filhos que conseguem andar por si próprios: "O Homem da Conspiração" e o "Gato Fedorento", versão televisiva.





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