segunda-feira, fevereiro 28, 2005

A vida intelectual dos macacos - 2


Costuma dizer-se que os exemplos vêm de cima. E há muitas pessoas que acham que a televisão está acima de nós, quase como uma referência espiritual, apesar de não assumida. E com comentadores como Luís Delgado, Carlos Magno, Miguel Sousa Tavares, Fernando Rosas, Perez Metello, aparecendo regularmente nos meios televisivos, é natural que os maus exemplos se propaguem. Comentadores fast-food que fazem pretensas análise on-line, descortinando causas e prevendo consequências.

Os três vértices da análise, descrição, causas e consequências, mais não são que uma cobertura para papaguear crenças, ideologias ou mesmo o puro ódio e inveja. São as descrições razoavelmente fiéis à realidade? As causas apontadas são credíveis? As consequências previstas verificaram-se? Sucessivamente, não, não e não. E quando, por acaso, acertam, logo nos fazem lembrar disso por ser acontecimento tão raro: «Eu antes já tinha previsto...», «Como eu sempre disse...», «Como eu há muito defendo e agora se veio a provar ser verdade...»

O que estes comentadores propõe fazer é, antes de tudo, um jogo aos seus ouvintes. Todos gostamos de uma disputa, de termos um lado para defender e outro para atacar. A mensagem implícita é “Junta-te a nós, não percas tempo, o confronto é excitante!” Afastada está a possibilidade de tentar fazer as pessoas pensar. Não, os espectadores não têm nada que pensar. Eles têm é que assinar por baixo e se não gostam não ouçam, ou então juntem-se ao outro lado porque também é preciso ter inimigos. Por isso, os comentadores nunca mostram dúvidas, para que os ouvintes também não as tenham.


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sexta-feira, fevereiro 25, 2005

A vida intelectual dos macacos - 1


Esta manhã ia sendo atropelado em plena passadeira. Meti-me com cuidado e o local é conhecido dos automobilistas por estar situado próximo de uma estação ferroviária. Fiz uma indicação ao condutor, sem me alterar, de que estava numa passadeira. Ele reagiu irado, fazendo uma expressão de ódio puro, gritando qualquer cosia que não ouvi por ele ter as janelas fechadas.

No comboio, um grupo de mulheres, que já ultrapassaram os 30, falavam animadamente das intrigas do trabalho. Não percebo as motivações doentias que, logo pela manhã, levam as conversas para as coisas mais banais e mesquinhas que podem existir.

Minutos depois, dois jovens na casa dos 20 sentam-se ao meu lado e começaram a falar ruidosamente. Filosofavam sobre as coisas do mundo. Um deles, universitário, avançou com uma tirada do género: «O mundo está muito alterado. Alguns locais estão a arder de tanto calor que faz. E na Ásia é ao contrário, chove e faz tsunamis.»

Destes 3 exemplos, os dois primeiro (grunhice e mesquinhez) são nossos velhos conhecidos. Já o terceiro exemplo tem mais que se lhe diga. Trata-se de uma espécie de idiotice refinada. Tenho visto surgir nos últimos tempos uma tendência das pessoas falarem sobre os mais variados temas, mesmo que deles nada saibam. Não vejo nisto um problema em si, mas não deixa de ser um fenómeno curioso. Falarei mais dele no próximo post.


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quarta-feira, fevereiro 23, 2005

A Primavera (é sexo, outra vez)


Já vi algumas andorinhas nos céus, significando que a Primavera efectiva não demora. Contudo, o começo desta estação esconde um imenso drama masculino. Refiro-me sobretudo aos mancebos que não têm uma companheira sexual ou se a têm, não andam muito satisfeitos.

O que acontece é que as jovens começarão a usar saias curtas e decotes atrevidos. As convenções sociais impedem que os jovens pungentes possam dar vazão a todos os seus desejos, que atingem o auge com o início da Primavera e o aparecimento de mais carnes a descoberto nas mulheres portugueses. E os homens, aos quais lhes ensinam que devem ser escravos dos desejos, passam tormentas inenarráveis por não os poder cumprir. Podem não acreditar, mas é mesmo um dos maiores dramas sociais que temos.


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terça-feira, fevereiro 22, 2005

Para descomprimir... Sexo!


Este blog andou a derivar nos últimos tempos. Andou a falar muito de política quando tenho outro blog mais propício a tais obscenidades. Agora que se inicia um novo ciclo, pensei que devia falar de outras coisas mais saudáveis. E um blog que é sobre tudo e sobre nada teria, mais tarde ou mais cedo, que abordar a temática sexual. Vamos então falar do assunto, mas não daquela forma professoral, como se estivéssemos a falar de tachos e panelas.

A questão do orgasmo é uma das maiores ilusões para os homens (com h pequeno). Penso que a excessiva importância que os homens dão ao orgasmo em muito se deve aos anos em que, sem uma companheira, dedicam-se à masturbação intensiva. Mais tarde, quando têm a possibilidade de iniciar manobras conjuntas, os seus hábitos ditam que eles se continuem a masturbar, embora o façam com um corpo feminino.

Isto é, se há mulheres que fingem orgasmos, há homens que fingem que os querem proporcionar. Mas fingir não é bem o termo, diria que é mais uma questão de auto-ilusão. Os pobres coitados nunca passam da fase de aquecimento e elas também não. E à conta destas insatisfações abrem-se consultórios e multiplicam-se revistas de sexo explícito ou implícito.

De forma inconfessa, são bastantes as pessoas que querem melhorar a sua performance sexual, mas tentam fazê-lo da pior forma – pelo intelecto e pelo exótico. Lêem tudo sobre sexo que lhes aparece à frente, querem descobrir técnicas tântricas, taoistas, lêem os clássicos eróticos, aprendem massagens, inventam esquemas de sedução, querem ter hiper-orgasmos, orgasmos sem ejacular, experimentar coisas que viram em filmes e em documentários.

Porque razão digo que tudo isto é um erro? Essencialmente porque é uma busca no exterior ao indivíduo. Como se o segredo de tudo fosse um pormenor que só alguns sábios conhecem, ou uma técnica secreta. Mais uma vez é um colocar o intelecto à frente do corpo, mesmo que seja o intelecto a pensar no corpo das formas mais explícitas.

Contudo, tudo seria mais fácil partindo do desejo mais puro. Falo, no meu caso, no desejo pelo corpo feminino, pelas formas, volumes, texturas da pele, pelas suas reacções, movimentos, gestos, gemidos, olhares. Numa lenta progressão (ou não), provando todas as partes, com uma atenção felina às reacções, com um empenhamento total em cada gesto em si, sem pensar apenas num qualquer culminar, torna-se secundário e acessório pensar no orgasmo (masculino), torna-se pouco importante saber se foi rápido ou demorado. O estado natural do homem numa relação (heterossexual) será o de dar prazer a uma mulher. Porque é no fascínio por ela que tudo começa.


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quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Boatos e mentiras

Esta campanha tem tido alguns boatos, uns contra Sócrates, outros contra Santana. A mentira descarada de ontem de Louçã e as consequentes reacções têm-me feito pensar sobre a alma humana. Por um lado, há que realçar positivamente quem não se deixa enganar, e tenta desmascarar tais fraudes. Nisso os blogs são um meio ímpar, porque não estão sobre os favores de ninguém, apenas mandados pelas consciências dos autores.

Contudo, também estes acontecimentos revelam algo frustrante. Pior que os mentirosos compulsivos como Louça, é a mediocridade que lhes abre caminho. Porque Louçã sabe que tem um chão fértil por onde pode colocar as suas sementes. Sabe que as pessoas por ódio, estão dispostas a tudo. Sabe, ainda, que as pessoas não vão ficar chateadas por ele as ter enganado, mas sim por a mentira ter sido descoberta.

Faz isto lembrar-me de uma frase das mil e uma noites, em que uma personagem maligna diz algo como «Que importa a morte se podemos ver o nosso inimigo morrer antes de nós?»


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Sobre as eleições

Face à imbecilidade que reina à minha volta, não consigo deixar de escrever sobre o debate de ontem. Talvez seja por estar doente, mas neste momento os portugueses parecem-me tão imbecis que merecem todo o mal que lhes vai acontecer. Tinha razão alguém que disse que quem quer enganar encontra sempre alguém que quer ser enganado (infelizmente não me lembro quem disse isto).

No seu habitual estilo, Louçã fez uma grave acusação, sobre isenções que teve a Banca. Alguns blogs reagiram de imediato, desmascarando a falsidade de Louçã. Sócrates aplaudiu o jogo baixo (a coligação a funcionar). Santana reagiu mais tarde, mas duvido que alguém lhe tenha dado a devida atenção. Ao mesmo tempo, Sócrates vem reiterando as suas propostas, ora banais, ora gravosas.

O Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), fala do défice e do peso da despesa pública por alguma razão. É que foi provado à saciedade que só mantendo os dois indicadores baixos se pode permitir o crescimento económico (não implicam crescimento económico mas apenas que o Estado não o estrangula o sector privado, esse sim o responsável pelo crescimento económico). É a maior ajuda que a UE nos podia ter dado, no entanto, por cá é encarado como um castigo.

Sócrates vem prometendo que nos vai libertar do castigo. De início ainda pensei que fossem apenas as típicas promessas irrealistas de campanha, mas não. Sócrates acredita mesmo que devemos caminhar em direcção ao abismo, que uma ponte invisível nos vai suster da queda. Os portugueses seguem o novo messias. Seguem não com uma fé inabalável mas apenas por comodidade. Numa altura em que, mais que nunca, se pedia aos portugueses coragem, fibra, atenção, criatividade e trabalho, os portugueses optam pela apatia. Entretanto, vou pensar em aperfeiçoar línguas estrangeiras. Emigrar pode ser a única solução. Talvez aprender chinês...


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sexta-feira, fevereiro 11, 2005

O autocarro luso

Expo 98. O autocarro luso conduzido por Guterres segue a elevada velocidade pela alta montanha. Os lusitanos estão eufóricos, nunca tinham estado tão perto do céu. Algumas vozes pedem mais velocidade, outros dizem que o autocarro não tem chassis para aguentar tais esforços, mas ninguém lhes liga. Os anos passam, a condução de Guterres era monótona e os lusos protestaram. O condutor Guterres amuou e foi embora.

De forma inesperada, o líder das críticas, Durão, foi forçado a ser o novo condutor. Pouco depois começou a gritar que o autocarro não tinha travões, os amigos de Guterres discordaram. O condutor Durão, desesperado, mete uma mudança mais baixa, para tentar substituir a falta de travões. Os lusos protestam, estavam habituados a altas velocidades, não gostam do ritmo mais lento. Entretanto, começaram a aparecer evidências que confirmavam duas coisas terríveis. Não só o autocarro luso não tinha travões como já não estavam no cimo da montanha mas sim na perigosa descida. Mas a maior parte dos lusos ainda não acreditava.

O condutor Durão passa dois difíceis anos, em que garante que a velocidade reduzida estava a resolver o problema da falta de travões. Contudo, certo dia desapareceu depois de ter recebido um pára-quedas com o emblema da EU. Após um impasse, o fiscal do autocarro, Sampaio, autorizou Santana a ser o novo condutor. Poucos meses depois, o fiscal mudou de ideias. Dois candidatos a condutor disputam o lugar. O demitido/demissionário Santana e Sócrates, amigo do anterior condutor Guterres.

Sócrates afirma que vai resolver o problema da falta de travões dando confiança aos lusos e acelerando o autocarro. Santana afirma que resolverá o problema mudando os lusos de local, eventualmente trocando os da janela com os da coxia. Outros candidatos menos prováveis avançam outro tipo de soluções. O candidato Jerónimo diz que o problema se resolve nacionalizando o autocarro. O candidato Louçã prefere liberalizar o consumo de drogas e do aborto na última fila do autocarro. O candidato Portas acha que tudo ficará resolvido se colarem a fotografia dele na frente do autocarro. O candidato Monteiro propõe trocar os ocupantes estrangeiros por mulheres lusas que fiquem sempre dentro do autocarro a cuidar dos filhos.

O autocarro ganha velocidade, ao fundo avizinham-se curvas apertadas. Alguns mais lúcidos perguntam se não é possível substituir os travões. Ao que parece, o autocarro foi feito de maneira a ser muito complicada a substituição. Depois, o fiscal Sampaio é muito apegado aos anteriores travões, mesmo que defeituosos. O candidato Sócrates acha que o problema não é a falta de travões mas a redução da velocidade imposta pelo anterior condutor Durão. E o candidato Santana tem medo de substituir os travões porque sabe que isso seria impopular entre os lusos por implicar um esforço de todos. O autocarro luso tem um despiste anunciado.


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segunda-feira, fevereiro 07, 2005

Confiança confundida

Não existe essa coisa da confiança excessiva. O que pode ocorrer é o défice de capacidades


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quinta-feira, fevereiro 03, 2005

Votar em branco – Um significado obscuro

Não é de hoje. Mas cada vez mais as pessoas desiludem-se com os políticos. Perto de onde trabalho, estão dezenas de cartazes de uma associação que prega pelo voto em branco. Estes são indícios claros de que o niilismo se instalou entre nós. Ele já cá estava, é certo, mas agora parece querer-se tornar numa ideologia dominante. Estas pessoas, que certamente perderam tempo e dinheiro para fazer os cartazes, sentiram-se motivadas em afirmar que vale a pena cruzar os braços e ficarem olhar para todos com ar de descrédito.

As ideias do género “eles são todos iguais” são cómodas mas revelam uma grande falta de coragem e, já agora, de energia e criatividade. As pessoas que desistem, que assumem uma postura anémica, não têm qualquer razão para se queixar dos políticos. A sua atitude, de uma tremenda arrogância moral, é que é verdadeiramente deprimente. E nem pode ser confundida com algum tipo de neutralidade. Não, este tipo de atitudes é tudo menos neutro, visa mesmo causar alguma influência, ao mesmo tempo que se demite de toda e qualquer responsabilidade.

Mas há algo mais que isso. A atitude do voto em branco tem algo de emocional. As pessoas que insistem no voto em branco não estão desiludidas porque discordam dos políticos. Nem mesmo porque as várias alternativas políticas lhes parecem todas erradas. O típico “votante em branco” parece-me ser bastante ignorante em relação a estas matérias, e para ele tanto faz um trotskista como um liberal (caso existissem nos partidos portugueses). A sua desilusão acontece porque não existem políticos com os quais consegue estabelecer uma ligação emocional. Acabam por ser românticos, não lhes interessa as coisas da economia, da liberdade, da organização, da justiça.... Querem um sistema onde apareça alguém que os arrebate. Querem algo que só existe nas ditaduras.


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quarta-feira, fevereiro 02, 2005

Vergonha de Deus existir

Recentemente assisto a uma pessoa (cuja identidade não posso revelar) que sai de um determinado local e costuma dizer: «Até amanhã, se Deus quiser.» Apercebo-me que algo não bate bem e, num repente, apercebo-me porquê. Trata-se da referência a Deus e a insinuação que Ele poderá muito bem decidir sobre os nossos amanhãs.

Até há uns anos atrás era comum expressões como esta, que mostravam uma submissão à vontade de Deus. Cedo notei que eram frases raramente ditas sem o seu verdadeiro significado, apenas fruto do hábito. E os hábitos mantêm-se por vezes durante tempos infindos, mesmo se forem hábitos estúpidos e degradantes. Por isso, nunca me passou pela cabeça que este hábito se alterasse.

Apercebo-me agora que é um hábito em vias de extinção. Cada vez Deus está mais afastado da nossa linguagem. Causa até certa estranheza as Suas referências. Há nisto um aspecto indiscutivelmente positivo. Deus passou a ser uma coisa mais do íntimo de cada um. A palavra passou a ser usada dentro dos grupos que admitem a sua existência. De certa forma, deixar de falar em Deus no geral é uma questão de ética, respeitando quem não é crente. Da mesma forma, em geral os ateus não gozam em público com os crentes.

É curioso que dou por mim, que não sinto necessidade de acreditar em algum ente superior para me guiar os passos, a sentir alguma nostalgia dos tempos em que se falava mais de Deus por tudo e por anda. Mas é uma nostalgia que difere pouco de tantas outras, das coisas que morrem e voltam renascer transfiguradas com outros nomes e outros sentidos.


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terça-feira, fevereiro 01, 2005

No trabalho

Três coisas muito diferentes:

- Estar no local de trabalho muitas horas por dia;
- Trabalhar muitas horas por dia;
- Trabalhar muito num dia.

E nenhuma delas se refere a produtividade.




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