terça-feira, janeiro 23, 2007

Será que faltam mulheres nos Grandes Portugueses?

Uma nota dominante sobre o programa a que refere o título é a alegada injustiça feita em relação às mulheres, especialmente por nenhuma estar presente nos 10 mais. Acontece que a votação não tinha como intenção corrigir as injustiças do passado, que é um dado adquirido. Todos sabem que as mulheres tiveram, em regra, um papel de menor protagonismo e ninguém as culpa por isso e são, antes, consideradas vítimas. Se as mulheres não podiam ser militares, não tinham direito a voto, não podem ser padres nem futebolistas a sério, poucas tinham direito à educação, como se pode esperar encontrar muitas mulheres empresárias, políticas, exploradoras, cientistas, etc?

Ao invés de aceitarem este facto, vários comentadores, e em especial a apresentadora, esforçam-se por censurar os votantes por não terem dado mais relevo às mulheres. Mas vejamos, estão 19 mulheres nas 100 escolhas, quase 20%, o que pelo menos os críticos admitem ser uma quantia bem melhor que a obtida noutros países. Num país com tantos séculos de história e tendo em conta que só nas últimas décadas as mulheres tiveram espaço para maior relevância, 19 mulheres é um número que só pode surpreender por ser tão elevado. E provavelmente injusto, já que algumas mulheres terão levado votos só pelo facto de serem do sexo afável.

Por exemplo, podemos considerar que a classificação no número 100 para Maria João Pires é demasiado modesta para uma das maiores pianistas da actualidade. Contudo, no campo da música erudita não há um único homem representado. Por outro lado, há duas fadistas, Amália e Mariza, mas nenhum homem representante da categoria. Temos também duas pintoras, Paula Rego e Maria Vieira, e apenas Almada Negreiros a contrapor. Dos seis poetas escolhidos, três foram mulheres. Num país dito de poeta, na maior parte homens, digamos que a proporção igualitária nos sexos só pode servir para abafar a classe hirsuta. Pense-se ainda no caso de Maria de Lurdes Pintassilgo, por mais simpatia que nos inspire a figura, a sua colocação na lista deve-se ao facto de ter sido a primeira mulher a exercer o cargo de Primeira-ministra. Não há aqui o menor indício de reconhecimento do mérito pessoal, qualquer mulher naquela situação arriscar-se-ia a ter o mesmo destaque. Por último, muitos portugueses ainda reconheceram méritos em Brites de Almeida, mais conhecida por Padeira de Aljubarrota. Mais uma vez há um certo paternalismo em ver grande valentia numa mulher que supostamente matou 7 castelhanos, se fosse um homem teria sido apenas a sua mera obrigação.

Maria Elisa e outros redutos do politicamente correcto não se conformam com esta ausência feminina. Pelo contrário, até penso que os portugueses reconheceram de forma generosa o papel das mulheres na sua História. Mas há ainda outro aspecto fácil de esquecer. Se as mulheres foram em grande parte impedidas de terem um papel de destaque, a vantagem é que também não há muitas que possam servir de figuras sinistras. Não é às mulheres que se assacam as culpas dos nossos falhanços, atrasos e atavismos. É bom que se tenha noção que grande parte do destaque que se pode ter é pela negativa.