quarta-feira, outubro 22, 2003

Portugal na nova e na velha Europa


Ao contrário do que se pensa, Donald Rumsfeld é uma das pessoas menos influentes na administração Bush. Não só as suas opiniões intervencionistas têm pouca adesão nos outros membros da administração, como dentro do pentágono a sua posição é muito mal aceite pelas principais chefias militares. Mas apesar disso, Rumsfeld conseguiu mexer com e ego europeu, falando nas duas europas, a nova e a velha. A forma indignada com que esta distinção foi sentida só lhe deu mais visibilidade, para não dizer força. Mas tendo sido proferida num momento quente da cena internacional, a velha Europa ficou como sendo a anti-americana e a nova Europa como sendo pró-americana. Mas mesmo esquecendo os americanos, talvez tenha ainda sentido fazer esta separação, apenas conceptual, entre as europas.

A velha Europa não deveria ser vista como algo depreciativo. Pode-se considerar que um país da velha Europa tem uma longa história sem interrupções de soberania, atingiu um alto grau de desenvolvimento, possui uma riqueza a todos os níveis, especialmente no cultural. Mas é também natural que esse mesmo país não tenha grande vontade nem energia para fazer mais e melhor, achando-se ter atingido o nível imediatamente abaixo da perfeição, e o estatuto de já não ter nada a aprender com ninguém. Daqui nasce também um espírito invejoso, disfarçado de elevados princípios morais, uma total falta de aptidão para situações novas que não estejam totalmente sob controlo e um condicionalismo moral sobre quem não alinha a roçar o totalitarismo. Ironicamente, esta velha Europa, após ter sido guiada pela direita retrógrada é agora consolidada pela esquerda radical. Todos querem manter o cadáver vivo por mais algum tempo.

Não é muito compreensível que Portugal queira fazer parte desta velha Europa, mas é o que acontece. Temos uma mentalidade que se voltou a fechar, temos um profundo horror à mudança, ninguém tem energia, e as novas gerações moralizaram-se no pior sentido do termo, apenas numa arrogância que deriva de uma pretensa superioridade. Mas a única semelhança que partilhamos com outros países da velha Europa é a longa história, não há o desenvolvimento, não há a riqueza. A Portugal faltou viver quase todo o século XX, por isso, deveríamos querer fazer parte da nova Europa, da que ainda se quer desenvolver, que quer experimentar coisas novas, que é criativa, que tem vontade de viver. Não devíamos querer extinguirmo-nos já em conjunto com os outros países da velha Europa, não fazemos parte do mesmo ciclo. Não acreditamos em nós, preferimos desistir fazendo e conta que estamos bem acompanhados no seio de uma requintada Europa. É pena, o extraordinário potencial dos portugueses podia ainda dar muito que falar no mundo.