Estava lá e vi (ouvi)
PARTICIPAÇÃO PÚBLICA
Ontem estava a ouvir na Antena 1 um daqueles programas em que há participação do público. Não sou eu contra este tipo de eventos, até por ser uma forma de sentir as pessoas mais comuns. O tema só podia ser Arafat. Não quero eu estar aqui a discorrer sobre a actual situação, porque ela pode ser lida em muitos blogs, alguns em grande nível. Vou salientar apenas um ponto que me deixou incrédulo. A determinada altura um interveniente, que até tinha um falar fluente e não parecia bronco de todo, começa a atirar culpas para os EUA. E termina de forma insólita. Para ele, era inconcebível que apenas os EUA tivessem direito de veto na EUA, porque não podiam ser só eles a ter este poder. Ainda põe em dúvida se a Rússia também teria e pedia se alguém soubesse que o corrigisse.
A jornalista que moderava o programa não o corrigiu, nem quaisquer dos intervenientes que lhe seguiram. Bem sei que não somos um povo muito culto e ávido de conhecimento, mas não esperava que uma coisa tão básica passasse em claro. Especialmente depois do 11 de Setembro, são incontáveis as vezes que em todos os meios de comunicação se falou na ONU e nos membros permanentes do conselho de segurança com direito de veto. Não vou dizer que os ignorantes não devam ter uma voz activa. Na realidade, nem sei mais o que dizer sobre isto.
DESPORTO E POLÌTICA
Também ontem ocorreu uma gala de desporto no Casino do Estoril, onde estive presente. Para além das pernas das bailarinas, duas coisas me chamaram a atenção. Uma foi obviamente a presença de Luís Figo. Pareceu-me ser uma pessoa simples e de fácil trato. Contudo, não lhe invejava as atenções que desperta. Percebe-se que os jornalistas tenham de aproveitar os breves momentos do futebolista por cá, mas comentei na altura que eu tenho bastante mais liberdade que ele, apesar da minha carteira ser infinitamente inferior.
Contudo, o momento de maior relevância blogística, a meu ver, foi a intervenção de Hermínio Loureiro, da Secretaria do Desporto. Não me sinto bem em dizer que me chamou a atenção a sua careca e baixa estatura, porque isso não pode classificar uma pessoa. Mas admito que tinha um grande preconceito em relação a tal personagem, nem sei bem explicar porquê, de origem quase visceral. E fiquei atento ao discurso tentando contar o número de ideias proferidas, que não passassem de banalidades e lugares comuns.
Foi o mais longo discurso da noite mas só lhe consegui retirar uma ideia. Na verdade, foi mais uma informação, referente a 2004 ser o ano da educação para o desporto. O resto do discurso não disse absolutamente nada, fazendo lembrar o sketch do Gato Fedorento. Estarei a ser injusto, porque a progressão do discurso de banalidades revelou uma grande sofisticação. Tratou-se mais de um exercício de protocolo, cumprimentar todas as pessoas e organizações presentes, cada uma com a sua relevância para memória futura, palmadinhas nas costas, falar no apoio para as próximas olimpíadas, mas sem avançar com ideias concretas. O final foi um exercício refinado de psicologia de massas. Falou de Carlos Queiroz e Luís Figo, que tinham sido figuras em destaque naquela noite, tentando assim obter mais aplausos para si mesmo usando aquelas muletas. Tudo de forma bem esgalhada, de quem faz aquilo à muito tempo, sem ser totalmente óbvio, apenas sugerindo aos inconscientes.
Nota: A propósito do Gato Fedorento, já há muitos meses que destaquei neste blog, num posto que se encontra perdido nos arquivos, a qualidade desta equipa de trabalho. Não tenho eu dúvidas agora que o Gato Fedorento reúne duas características que combinariam mal. Uma delas é ser dos programas com menos meios que é feito actualmente em Portugal. A outra característica é ser simplesmente o melhor programa de TV feito em Portugal nos últimos anos. A maior parte do actual sucesso do programa nas massas deve-se a uma versão reduzida de um sketch niilista, que deu em publicidade. À boa maneira atávica dos portugueses, é apenas reconhecida a frase chave (“Eles falam, falam... e não os vejo a fazer nada”), passando despercebida a genialidade de colocar alguém a falar durante vários minutos sem dizer absolutamente nada – o que constitui o paradigma europeu dos tempos modernos. Contudo, o Gato Fedorento é muito mais que isto, conseguindo trazer ar fresco e uma surpresa permanente a um local que há muito se encontrava estagnado.
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