quarta-feira, agosto 16, 2006

Falsas imagens de nós mesmos

Por incrível que pareça, onde o ser humanos mais frequentemente erra é na avaliação de si mesmo. Estando o objecto de análise disponível 24 horas por dia, nem tempo nem disponibilidade faltam para fazer avaliações mais correctas. Pensemos nas avaliações demasiado optimistas. O erro está em nos acharmos lúcidos e que temos o domínio das situações. Ora a sensação de lucidez é um tremendo disparate, porque o aproximar à verdade faz-se no meio da dúvida e sempre com humildade. Quem se acha lúcido apenas goza a excitação de ver os seus dogmas reforçados.

A ilusão do controlo é talvez ainda mais nefasta. O dependente de drogas, o maníaco ao volante, o casal em conflito, o aluno que se deixa atrasar, todos eles sentem que têm um grande domínio da situação. Quanto maior é o risco, a verve que daí advém provoca a ilusão do o controlo ser maior que nunca. Daí ao desespero há uma distância imensurávelmente curta. Com o envelhecer, as pessoas vão aprendendo aos poucos os enganos presentes nestas situações bem catalogadas. Esta aprendizagem, de evitar os erros mais comuns, é chamada de amadurecimento. Mais um erro de avaliação, porque o fundamental não foi abalado e o indivíduo continua a ter a ilusão do controlo, no trabalho, com os filhos, colegas e amigos, onde não se apercebe da deterioração das situações, também ajudado pela hipocrisia reinante que evita confrontos e lhe dá a sensação de que está tudo bem.

Por outro lado, há as avaliações demasiado negativas. As pessoas acreditam pouco no seu potencial. Ou pensam que não nasceram para determinados voos ou então que são demasiado velhos ou ainda que nunca terão as condições necessárias. Então, se as pessoas tivessem todas as mesmas condições e começassem a ser “preparadas” na mesma idade, iriam ser todas geniais? Claramente não, a realidade não se coaduna com as nossas fantasias igualitaristas e pode ser bem cruel. Muitos jovens hoje em dia não percebem isso e querem que alguém lhes reconheça o talento que eles, inegavelmente, não possuem. Mas penso que para a maior parte de nós a ilusão é no sentido contrário. Não, não podemos ser geniais em tudo e talvez nem sequer muito bons em alguma coisa. Ainda assim, a maior parte das pessoas tem o seu potencial subaproveitado.

Outro erro de avaliação diz respeito àquilo que os indivíduos conseguem aguentar. A sensação de não poder mais, de que isso está para além dos “meus” limites, são o pão-nosso de cada dia. Mas que sentido tem falar de limites quando os ultrapassamos já vezes sem conta? O limite não tem a ver com a realidade, é apenas uma noção no momento ditada pelo desejável ou pelo sofrimento. Mas quando parar não é uma opção (na guerra, os pais que cuidam o bebé, o trabalho importante que não se pode parar) os indivíduos ultrapassam o “limite” e continuam num torpor, à espera de caírem para o lado a qualquer momento, mas não raras vezes, em vez do desfalecimento aparece é uma energia formidável que nos leva para outro plano.