terça-feira, maio 15, 2007

Civilização e religião (3)

A IMPORTÂNCIA DA CULTURA – 1ª PARTE

Os próximos posts resumem a palestra “Culture Matters”, de Roger Scruton.

Havia esperança na reconstrução da Europa depois do término na Segunda Guerra Mundial porque as nações, tanto as vencedoras como as derrotadas, tinham sido moldadas por dois mil anos de cristianismo e direito romano. Comunismo, fascismo e nazismo eram vistos como traições a essa herança cultural e o essencial era voltar a recuperá-la. Esta mentalidade estava presente nas pessoas que estabeleciam os currículos universitários das áreas humanas, apontando-os para a cultura ocidental.

Trata-se de uma herança multifacetada que joga uma dialéctica entre a fé cristã e o cepticismo iluminista e a apreensão de ambos permite elaborar uma síntese que os transcende. Este consenso em redor da importância da cultura ocidental não criou um exército de intelectuais a falar a uma só vez, pelo contrário, cada um acabaria por seguir uma tendência específica, alguns optando por estudar as criações inspiradas na fé, outros dando à ciência uma importância central. Em termos políticos esta formação base não impediu o surgimento de socialistas, liberais e conservadores, porque a política ainda era vista como matéria de opinião e a cultura uma forma de conhecimento superior, indispensável para conhecer o sentido da vida se abordada a partir de uma postura crítica que, ao mesmo tempo, impediria a degradação dessa mesma cultura. O foco na cultura ocidental acabava por abrir caminhos para universalismo, lembrando apenas nomes como Mahler, Vang Gogh ou Pound que faziam a ligação ao extremo oriente.

Esta forma de educação, aberta tanto à crítica como ao enlevo, era sentida, após a alienação da adolescência, como a entrada numa catedral, um local de julgamento, discriminação e alusão, onde tudo passa a estar carregado de sentido. Apesar da conotação religiosa, tratava-se de uma abordagem onde os não crentes sentiam-se igualmente tocados sem a sensação de submissão a um programa ideológico.

O panorama actual na maior parte das universidades alterou-se radicalmente. A cultura ocidental ainda é um tema importante mas passou a ser vista como agressiva, culpável e estranha em relação ao mundo actual. O professor acha que a sua principal missão e instigar o aluno contra a sua própria cultura e propor um dos inúmeros métodos alternativos, cuja prodigiosa variedade parece apenas confirmar que a cultura «clássica» agrilhoava toda esta saudável efervescência. É o neo-marxismo (Frederic Jameson), o estruturalismo (Roland Barthes), o pós-estruturalismo (Michel Foucault), o desconstrucionismo (Jacques Derrida), o pós-modernismo (Jean-François Lyotand), o neo-historicismo (Stephen Greenblatt), o pós-colonialismo (Eduard Said), o neo-pragmatismo (Richard Rorty), a que se juntam as teorias “queer” e feministas.

Uma tão grande profusão de correntes em poucas décadas não se deve certamente a um surto de genialidade mas a um excesso de auto-convencimento. Se ao invés da busca sobre o que diferencia estas correntes procurarmos os pontos que têm em comum, a variedade esvai-se num ápice, logo à cabeça com o desígnio comum de combater a cultura e a civilização ocidentais. Outras características comuns revelam-se na linguagem obscura e pretensiosa e num programa político subjacente.