quarta-feira, dezembro 17, 2003

Graffiti – Um modo de vida


Como jovem rude do campo que fui (agora já não sou muito jovem), os meus contactos com o graffiti ocorreram através do cinema, em finais da década de 80 do século passado. Com a ingenuidade da época, via aquelas pinturas murais como uma realidade distante, em que misturavam várias coisas contraditórias, como a marginalidade, desprezo pelas autoridades, mas também talento e criatividade.

Mais tarde, quando vim estudar para Lisboa, deparei-me com alguns graffitis ocasionais em algumas paredes da cidade, o que me faziam, por momentos, transportar para aqueles cenários dos bairros degradados norte-americanos que relembrava dos filmes. Recordo particularmente da demolição de um prédio, que escondia por trás um graffitti antigo e que era uma autêntica obra de arte, surpreendente e cativante.

E hei-nos chegados ao tempo actual. A dúvida é se ainda há graffitis ou apenas vandalismo mural (e de comboios e edifícios) sem sentido e sem qualquer valor estético. A feiosidade dos actuais graffitis, que quase não passam de um aglomerado de letras garrafais que nos fazem desviar o olhar, é aparentemente um sinal da sociedade actual. Serão os graffitis um sinal de desespero de jovens que vivem em bairros degradados, sem esperança e sem rumo, com dificuldades de integração e tudo o mais? Talvez sim, em parte, mas...

Há uns meses atrás, caminhando pelas ruas de Lisboa ao fim da tarde , não muito longe da Praça de Espanha, deparei com dois “graffiters”. Surpresa, não eram jovens com ar de marginais, nem de descendência africana. Não, eram dois miúdos de 15 ou 16 anos, autênticos betinhos, com todo o ar de quem os pais os vão pôr à escola de Mercedes ou BMW. Magros, olhar mortiço, coluna torta e boca semi-aberta – o modelo do filho do novo-rico. Ainda tive a tentação de dar um par de chapadas a cada um, para os ver se os acordava daquela modorra (e para eles deixarem de fazer os pseudo-graffitis), mas pensei que ainda podia ser processado pelos papás, que devem ter dinheiro suficiente para contratar bons advogados ou então ter influências na comunicação social. Que pena já não haver espancamentos públicos...