terça-feira, fevereiro 17, 2004

Ideias fortes, pessoas fracas


Mote

Chamais alma ao que tão frouxamente
vibra em vós? O que, como o soar dos cascavéis dos loucos,
pede aplauso e corteja dignidades
e finalmente, pobre, morre uma morte pobre
na tarde incensada de capelas góticas,
chamais a isso alma?

Quando olho a noite azul, pelo Maio nevada,
em que os mundos giram longas vias,
então me parece que trago em mim um pedaço
de eternidade no peito. Agita-se, e grita,
e quer subir e quer girar com eles...
E isso é que é alma.

Rainer Maria Rilker


Muitas vezes, chateia-me falar com pessoas com ideias fortes, que se escondem atrás da ideologia ou da religião. Incluo neste rol pessoas com grandes convicções à direita ou à esquerda, comunistas, conservadores, cristãos, crentes nos ovnis extra-terrestres, entre outros. Defendem com frequência ideias e posições completamente disparatadas, mas fazem-no com uma arrogância que lá por trás diz: «Não falo só por mim, mas pelo meu grupo. Somos milhares ou milhões, pensamos todos assim. Acreditamos a sério no que dizemos e alguns de nós deram a vida por isso. Se me contradizeres, é uma falta de respeito para muitas pessoas. Na verdade, somos tantos que as tuas míseras ideias nada valem frente às nossas.»

Utilizam a boa vontade dos que os ouvem e que respeitam convicções profundas de outros, mesmo discordando completamente delas. Aproveitam os silêncios para dominar conversas e tomam as suas ideias como sendo partilhadas por todos. Não se interessam sobre o que os outros pensam nem se o que dizem os magoa. Pelo contrário, ao pressentirem que alguém os afronta, mostram-se indignados e agressivos. Nunca têm dúvidas e se alguém não partilhar das suas ideias é por ser pouco inteligente ou mal intencionado.

Há também os que têm ideias fortes mas não as usam contra os outros. Preferem não falar sobre as suas convicções mais profundas, sentindo que isso é quase uma pornografia espiritual. Quando alguém os repudia, não reagem exaltados, chegando mesmo a questionar se não estarão eles próprios errados. Seguem o seu caminho sem pretenderem converter alguém e pouco lhes importa se são eles que têm a última palavra ou ganhou uma discussão. Talvez as suas ideias sejam mais fracas que as dos primeiros. Mas estes, sem dúvida, são pessoas mais fortes.