segunda-feira, maio 23, 2005

Futebol-religião Benfica (1)


Há quem identifique nos movimentos em redor ao futebol o fenómeno tribal. Tal identificação terá algumas pernas para andar, mas é um caminho fácil, porque existem muitas outras manifestações sociais onde o tribalismo se verifica. Acontece que o futebol é diferente, e se quisermos explicar alguma coisa temos de encontrar o que existe para além do tribalismo que justifique esse “algo mais” que existe no futebol.

Dizer que futebol é religião, apenas, é um erro. Não é erro apenas porque todos sabemos que se trata de um jogo. É também erro porque, considerando o futebol em termos latos, o fenómeno do “ser adepto” é explicado pelo tribalismo em muitos casos. Contudo, a partir de certa dimensão entra-se no domínio religioso. Essa dimensão estende-se em dois patamares distintos. Um deles, voltado para o exterior e que abordo neste primeiro post sobre o assunto, é facilmente observável. Tem a ver com o número de adeptos e a forma natural como ocorreu a sua expansão. Não é difícil de identificar em Portugal o SLB como o clube de maior expressividade neste ponto de vista.

Ao contrário do que muitos querem fazer crer, o SLB não foi o clube do antigo regime. Muito pelo contrário, o SLB foi a única força que conseguiu criar um espaço de liberdade num país amordaçado, e fê-lo contra o regime. Nos anos que se seguiram ao término da segunda guerra mundial, o SLB correu o sério risco de ser encerrado, por estar cheio de oposicionistas. O clube foi despejado de vários locais e conseguiu uma proeza que seria considerada impossível nos tempos de hoje: construir um estádio apenas com o dinheiro dos sócios, sem qualquer subsídio-dependência envolvida.

A popularidade do SLB levou a que muitos homens de negócios se lhe quisessem colar na ânsia de terem protagonismo social, tendência que se manteve até hoje. Mas, ao contrário do que acontece em outros clubes, nada no SLB têm tendência a eternizar-se e os benfiquistas sabem reconhecer quando erram. O confronto entre o Estado-Novo e o SLB foi amenizado com alguma cedência de ambas as partes. Contudo, foi o próprio regime que teve de fazer as maiores adaptações, que lhe passaram a ser proveitosas depois da afirmação europeia do SLB. Novamente, esta é uma tendência que também se verifica com os políticos de hoje, que gostam sempre de se colar às vitórias desportivas. Contudo, o SLB nunca prestou vassalagem ao regime, a qualquer que fosse. É curioso ver que mesmo depois do 25 de Abril o SLB continua a ser um clube incómodo para os regimes, mesmo democráticos, que têm nas suas principais figuras quase sempre adeptos dos outros “grandes”. Parece que a dimensão do SLB assusta, e mesmo quando os nossos líderes máximos executivos (PM) são benfiquistas, parecem comportar-se como se isso fosse um handicap.

(Cont.)