sexta-feira, maio 20, 2005

Um mundo em mudança (10)


A CHINA

Em 1421 partiu uma armada chinesa, comandada pelo Almirante eunuco Zeng He, que tudo indica ter dado a volta ao mundo, chegando mesmo ao ponto de estabelecer colónias em várias partes da Austrália e do continente americano. A armada inicial dividiu-se em várias, cada uma delas tendo realizado feitos extraordinários. Poucas embarcações voltaram, e quando o fizeram, razões de política interna ordenaram a sua destruição, bem como de todos os relatos das viagens. A China fechou-se e voltou a ser um gigante adormecido. Quando os portugueses se fizeram aos mares, é quase certo que já tinham na sua posse um plano de “descobrimentos” bem delineado, baseado nas cartas chinesas (a ligação é feita por cartógrafos venezianos, e o prestígio que a coroa portuguesa tinha conseguido junto ao papa devido à conquista de Ceuta).

Em 2021 a China deverá fazer as comemorações dos 600 anos da partida dessa armada, com os livros de história já corrigidos, uma vez que existe um entusiasmo mundial de vários académicos sobre este assunto. Por essa altura, a China poderá finalmente acordar, talvez como nunca o tenha feito na sua história de milénios. Das culturas antigas, foi a única que se manteve. Conseguiu passar por várias crises, invasões, longos períodos de apatia e comodismo, que fizeram que alguns fundamentos se tenham perdido, ficando a forma. O grande teste de resistência deu-se no século XX, um século atribulado, que teve o seu paroxismo na revolução cultural.

Quem leu relatos dos acontecimentos relativos à revolução cultural, deve ter pensado que se tratou na machadada final na cultura chinesa. A China passaria a ser como a Grécia, Itália (Roma), Egipto, Irão (Pérsia), que se reclamam herdeiros de algo que já não são, sentem ou sequer compreendem. Contudo, nem a brutal revolução cultural conseguiu eliminar a China antiga e criar uma nova. Há sempre formas de esconder objectos, livros e documentos, mas acima de tudo, conseguiram guardar várias pessoas em si toda uma infinidade de tesouros, de saberes, técnicas e sabedorias milenares.

Obviamente a maior parte dos chineses não faz parte desta elite que guardam o tesouro. O regime ainda é de ditadura e o trabalho escravo é uma realidade de milhões e milhões. Mas as mudanças já são evidentes nesta altura e não é uma previsão surpreendente colocar a China dentro de 15 anos uma das maiores potências mundiais, talvez já sobre um regime liberal. Aliás, quando se fala na ética protestante e no Capitalismo, talvez seja ainda mais fácil fazer a relação entre o Capitalismo e as religiões com maior expressão na China, o confucionismo, o taoismo e o budismo. Especialmente o confucionismo, que para os ocidentais é mais assemelhado a uma filosofia de vida do que a uma religião, com regras práticas de bom senso. Tal não é difícil de compatibilizar com o liberalismo. Talvez seja a China comunista que irá acabar de vez com o cisma ideológico.