segunda-feira, setembro 29, 2003

Sobre este blog


Em finais de Julho deste ano iniciei a minha pequena aventura na blogosfera. O meu contacto com os blogs tinha se dado apenas algumas semanas antes, e na altura não tinha sentido qualquer atracção em fazer parte desta comunidade. Mas a diferença entre um sim e o não é como um salto quântico que pode ocorrer a qualquer altura.

As minhas expectativas para este blog, em termos de sucesso exterior eram limitadas. Tinha a noção de que já se havia ultrapassado o ponto de saturação e daí para a frente qualquer novo blog não iria fazer grande diferença, especialmente se de autoria de um desconhecido.

Tudo começou por ser provisório. O nome do blog, o endereço URL, o template, até o primeiro post, que era apenas um pequeno texto que tinha escrito num fórum do Expresso. Mas tudo isto ficou definitivo, tendo mudado apenas a descrição do blog, actualmente apenas «Pensar. Escrever. Esquecer.», um dia explico porquê.

Fui fazendo pequenas alterações, mudei o tipo de letra, fui acrescentando uns links de outros blogs, comecei a justificar o texto, e hoje coloquei um contador. Ainda pondero um sistema de comentários.

Sobre o conteúdo, poderá se reconhecer que é um blog generalista mas que tem uma certa aversão às actualidades, tentando evitar comentá-las, apesar de ter algumas tentações. Hesitei em publicar o post sobre o anti-americanismo, que já há muito havia sido pensado, mas com ele consegui alguma projecção. O O Intermitente publicou um link para aqui e recebi alguns mails de elogio. Talvez a pouco e pouco o blog se torne mais conhecido, mas melhor seria ser reconhecido.

O contador está a zeros, seis no total. Mas há que ver que nunca se tem nada, nem os textos publicados ainda são do seu autor, passam a ser livres.




(ver mais)

quinta-feira, setembro 25, 2003

Anti-Americanismo - Três tipologias fundamentais


Num mundo global, como é o em que vivemos, são necessárias forças agregadoras para evitar que o sistema social entre em colapso. A “força” que actualmente mais povos agrega em todo o mundo é o anti-americanismo (AA). Devido ao sucesso que tem obtido também em Portugal, decidi fazer uma descrição dos 3 tipos fundamentais de AA. Leia com atenção e decida qual dos formatos melhor se adapta à sua personalidade.

Anti-Americano Primário (AAP): O AAP tem um profundo desconhecimento sobre os EUA. Nada sabe da sua história, nem dos hábitos culturais. Para o AAP todos os americanos são iguais, todos pensam de igual forma, todos falam com o mesmo sotaque, todos são burros e todos são maus. No entanto, o AAP é muitas vezes um ardente consumidor dos maus produtos americanos (grande parte dos filmes, séries, comida rápida e música oriundas deste país). O AAP não é fanático nem particularmente incisivo nas suas posições, podendo tornar-se num Pró-Americano Primário com grande facilidade.

Anti-Americano Ideológico (AAI): O AAI acredita que nasceu e vai morrer anti-americano. O AAI é pródigo em teorias que justificam as suas posições e que, periodicamente, encontram eco na sociedade. Os AAI autênticos são relativamente raros. Poder-se-ia pensar que nas manisfestações da moda (anti-globalização, anti-americanas, anti-conflitos-onde -entrem-os-americanos) são compostas na sua maioria por AAI. Mas é um engano, porque grande parte dos intervenientes são meros AAP. Mas os AAI têm um papel relevante como organizadores e dinamizadores aguerridos, dizendo as palavras de ódio certas nos momentos certos, dando assim alma à massa amorfa de AAP. Os AAI surpreendem-nos muitas vezes com um conhecimento profundo sobre os EUA, que poderá até parecer admiração, que depois se transformou em inveja.

Anti-Americano Evoluído (AAE): Os AAP não gostam de ser confundidos com os outros dois tipos de AA, achando-se superiores a estes. Os AAE defendem todas as posições com uma convicção que nos espanta, muitas vezes entrando em contradição com ideias que defenderam anteriormente. Quando confrontado com isto, o AAE explica-nos paternalmente as suas razões, que têm por fundo a ideia: «Eu sou coerente, você é que não é inteligente o suficiente para me perceber isso.» O AAE fala frequentemente na TV em momentos de crise, onde consegue mostrar um ar superior e ao mesmo tempo fútil. Alguns AAE ganham notoriedade escrevendo livros que fazem um grande furor, ganhando a reputação de serem mentes brilhantes, que infelizmente se perde mais tarde com essa coisa dos “factos”. Tal como o AAP, o AAE tem grande facilidade em mudar de campo, tornando-se num PAE (Pró-Americano Evoluído) se as circunstâncias se revelarem apropriadas para isso.

Todos estes AA têm em comum o facto de nehum deles se assumir como AA. Estas tipologias fazem sentido sobretudo a nível europeu, e em especial em Portugal. No resto do mundo é crecente um outro tipo de AA, o AAA ou 3A (Anti-Americano Assumido). Este tipo de AA é diferente de todos os outros, e o seu anti-americanismo é mais real e mais profundo que os anteriores, estando muitas vezes relacionado com razões históricas que os envolveram de facto com americanos. Trata-se de um assunto vasto e que merece uma atenção especial e mais séria, que não será aqui dada por agora.





(ver mais)

quarta-feira, setembro 24, 2003

Tendência não é destino


Quando era mais novo gostava muito de citações e de frases “entre aspas”. E ainda gosto, mas por vezes parece-me que já nenhuma coisa que leia me possa surpreender. Por outro lado, muitas vezes as citações têm pouca aplicação prática, não passando de curiosidades com pouca utilidade na vida diária.

No entanto, ouvi há algum tempo atrás uma citação que me chamou a atenção particularmente: “Tendência não é destino. E quando a sociedade se apercebe que algo está mal, aí começa a mudança”. Ouvi isto na rádio e tenho pena de não ter fixado o nome do autor. Falava-se de arquitectura, em especial no redesenhar das cidades. Mas, um pouco por todo o mundo, o pessimismo domina e as pessoas parecem acomodadas com os problemas para os quais não vêem qualquer solução.

Achei a frase muito bem apanhada e que pode ser aplicada a quase tudo. Aqui há um novo tipo de esperança. Não aquela esperança bacoca, do tipo “Se eu acreditar muito numa coisa ela vai-se realizar”. É uma esperança activa, que diz para nos mexermos e pôr-mos os outros também em movimento. E tudo começa na consciência, que tem de ser de todos e não só de alguns.

Nisto critico alguns “intelectuais” que acham que só eles têm capacidade para perceber as coisas e discutir as possíveis soluções, tornando tudo hermético para o exterior. A solução é exactamente o oposto. Se os intelectuais querem resolver alguma coisa (tenho dúvidas em muitos casos...) o que têm de fazer é tornar as coisas claras para todos, sem serem demagógicos. A consciência dos problemas tem de ser o mais ampla possível, sem nunca se perder o rigor.

Agora, quando penso num problema aparentemente crónico, como a brutalidade dos portugueses ao volante, já não vejo isso com fatalismo. Penso que há uns anos atrás apenas alguns falavam disso e era vulgar muitos se gabarem das atrocidades que cometiam. Hoje já se nota algumas diferenças, a consciência de que conduzimos mal vai aumentando. A mudança já começou.





(ver mais)

terça-feira, setembro 23, 2003

Crónicas de um futebol esquecido (1)


BRONCOS, ARTISTAS E GÉNIOS

As pessoas que lêem este blog, umas duas ou três contando comigo, podem ficar descansadas. Não vou iniciar aqui uma secção de comentários sobre a jornada anterior, porque iso são conversas de café. Opiniões sobre futebol são as ideais para entrar num ouvido e sair pelo outro ou por onde der jeito, e raramente deviam ficar escritas. Apenas vou falar de coisas que, em teoria, possam interessar mesmo às pessoas que não gostam de futebol.Porquê o título desta crónica referir broncos, artistas e génios. A verdade é que foi a primeira coisa que me surgiu, e a minha preguiça mental leva-me a acreditar que o título é bom e, assim, não vale a pena pensar noutro. Mas, à boa maneira portuguesa, vou tentar justificar o que não tem explicação, entrando em contradição comigo próprio.

Toda a gente sabe que o futebol é para broncos. Os jogadores são broncos, os treinadores também, os presidentes dos clubes nem se fala e os adeptos pior ainda, como se pode ver pelos idiotas das claques organizadas. E os árbitros também devem ser porque todos os insultam e isso não é bom sinal. É esta a visão que muitos têm sobre o futebol, especialmente a nossa intelectualidade de pantufas (se fosse mau diria que é assim do tipo “pessoal dos blogues”).

Já os jornalistas desportivos querem-nos fazer crer que no futebol só há artistas e génios. Onde está a verdade? O que vejo é que no futebol há de tudo, há os broncos, os jogadores são quase todos uns artistas e, dentro deles, por vezes há alguns génios. Mas há volta do futebol e também dentro dele, o que predomina são as pessoas normais. É uma ideia errada pensar que todos os adeptos de futebol são broncos. Um jogo de futebol é sempre mais civilizado que uma manifestação anti-globalização. Mas sobre isto gostaria de falar num outro post (sobre a ida à Catedral).

E como distinguir, dentro dos futebolistas, entre os artistas e os génios? No actual futebol português é fácil, não há nenhum génio, o que há são diferenças de nível e até de classe. Mas a genialidade é uma coisa à parte. Gostaria de contar um pequeno episódio sobre um génio do futebol.

Era eu ainda um criança e fui uma vez acompanhado de familiares ao Estádio da Luz. Era um dia rotineiro, nem sequer havia treino, e fui lá só para ver o estádio. Por coincidência, estava lá o Eusébio, que também já não jogava profissionalmente fazia muitos anos. Encontrava-se atrás da baliza, a cerca de 30 metros, e rematava bolas com a intenção de passarem por cima da barra e que entrassem depois. Não dava qualquer efeito à bola e nem tentava aproveitar o vento. Eu olhava para Eusébio, com uma grande perícia no remate e ao mesmo tempo parecendo uma criança brincando. Marcar golos daquela posição parecia-me impossível, mas Eusébio já tinha conseguido alguns. E eu intrigado.

E para que servia aquilo? Aparentemente, absolutamente para nada, as regras não permitem marcar golos de trás da baliza. Mas os génios são mesmo assim, estão sempre a pensar e a fazer coisas que não servem para nada, como almas livres. E é nesta busca desinteressada que, por vezes, descobrem uma forma única e completamente nova de fazer algo. Passados muitos anos, essa forma única é copiada por todas e catalogada como clássica.





(ver mais)

segunda-feira, setembro 22, 2003

Fomos falar com os portugueses


Os telejornais estão cada vez mais democráticos. A opinião dos portugueses conta, seja sobre política, economia, futebol, justiça, escandalos vários. Tornou-se hábito os jornalistas irem para a rua saber a “opinião dos portugueses”. Os lugares escolhidos para fazer estes apontamentos de rua não variam muito, quase sempre em Lisboa. Pode ser na Av. 5 de Outubro frente à RTP (o facto de serem sempre jornalistas da RTP é pura coincidência), ou então frente ao Saldanha/Atrium Saldanha e ainda na baixa lisboeta.

Querem-nos fazer acreditar que tudo aquilo é muito espontâneo, e as opiniões que se mostram são um espelho da alma do país. Eu, que frequento estes locias, não os vejo como representativos de Portugal, mas apenas de si mesmos. E nunca tive a sorte de me entrevistarem, porque de certo ia fazer um brilharete com uma resposta fantástica, ao mesmo tempo que espetava uma alfinetadela no jornalista tão sutil que ele só se daria conta depois da peça ir para o ar.

Outra coisa que os jornalistas parecem querer esquecer é que não é possível fazer uma sondagem com 5 opiniões (chamam-lhe de pequena sondagem). A estatística, base de qualquer sondagem, só é válida quando se tem uma amostra significativa e aleatória. Mas para o que se pretende, é perfeito. Porque basta fazer uma reportagem onde consta a opinião de meia dúzia de pessoas, todas dizendo o mesmo mas com umas diferenças de estilo, se possíveis caricatas, e anunciar: «Os portugueses estão contra o aumento do preço dos rolos de papel higiénico. Fomos falar com eles e veja o que disseram...»





(ver mais)

sexta-feira, setembro 19, 2003


(ver mais)

Livros & leituras (1) - Viver para contá-la – Gabriel García Márquez


Antes de falar no livro em questão, gostaria de dar uma pequena explicação do porquê de também comentar livros. Começa por ser para não os deixar morrer e, sabendo que em cada livro que ler, possivelmente irei comentá-lo, então a leitura será mais atenta e, logo, mais “prazeirosa”. Serão comentários de alguém que não é especialista em livros e, por isso, não se alongará em descrições sobre o estilo, a forma e o enquadramento literário, e irei só àquilo que considero a essência, sem me meter a explicar sobre o que não sei. Muitas vezes, mais interessante que as divagações dos eruditos são as impressões da pessoa comum.

Viver para contá-la é, penso, o livro de despedida de Gabriel García Márquez (GGM). Já tinha lido quase todos os seus livros e visto um documentário sobre a sua vida. Sabia que tinha estudado direito e sido jornalista. Mas isto nada diz sobre a vida real, GGM nunca se sentiu bem a estudar direito, curso que mal começou, e a sua entrada no jornalismo nada tem a ver com o que acontece actualmente aos jovens estagiários de comunicação social.

Nas suas quase 600 páginas, o livro fala, aproximadamente dos primeiros 30 anos de vida de GGM na Colómbia, antes de vir para a Europa. É a sua formação como escritor e como homem, onde até aí só tinha escrito alguns contos, “A Revoada” e ainda “O Relato de um Naufrago”, que foi o seu último trabalho como jornalista. GGM ainda não havia escrito nenhum dos seus romances que o iriam tornar mundialmente famoso, mas já levava a matéria de fundo de “Do amor e outros demónios”, “Crónica de uma morte anunciada”, “Amor em tempos de cólera”, este baseado em parte no romance dos seus pais. Levava também já dentro de si o ambiente mágico e meio onírico que existe em vários dos seus livros e em especial de “Cem anos de solidão”, em que ficamos a saber que certas coisas no romance se tinham passado na vida real, como a irmã que comia terra e o avô que fazia peixinhos de ouro.

Mas o livro não é uma manual para ser escritor, apesar de GGM dar algumas pistas para isso indirectamente, nunca dando qualquer conselho. As circunstâncias passadas não são repetíveis, nem as pessoas são repetíveis. E muitos tiveram vidas e experiências como ele, mas nenhum escreveu como ele.A Colômbia do século XX é um local de um caos previsível, onde os génios aparecem como cogumelos e os massacres são vistos simultaneamente com terror e com naturalidade. Há uma tristeza no ar, ao mesmo tempo em que as festas se improvisam naturalmente e qualquer um se pode facilmente transformar num poeta, cantor ou instrumentista de excepção. Parece não existir um sentido histórico profundo, apenas algumas recordações do século anterior, mas é tudo asfixiante por ser tão pouco para a riqueza daquele povo. Liberais e conservadores alternam no poder, podendo os homens de poder tanto ser cavalheiros de excepção como brutais carniceiros. Os colombianos parecem ver o futuro e o exterior, para o bem e para o mal, como os EUA, com algumas recordações de Espanha e passagens por países vizinhos.

No seu estilo, GGM não conta a sua vida de forma linear no tempo, indo por vezes para trás e para frente, dando um sentido encantatório às coisas, mas ainda assim dando um retracto fiel do sucedido. GGM fala da sua vida sem censura, não esconde nada, mas mantém o recato. No alto da sua idade, GGM descreve a sua vida à distancia, como se fosse de outrém, mas simultaneamente com a lucidez do dia seguinte.

GGM não fala só de si, fala também dos seus pais, dos seus avôs. A vida em criança é atribulada, com a constante mudança de casa. GGM torna-se “autónomo” quando vai para o colégio. Nunca mais irá viver com os pais, que só visitará esporadicamente, muitas vezes não reconhecendo alguns dos seus muitos irmãos. GGM confessa a sua timidez, fala do seu envolvimento com mulheres, algumas casadas, outras prostitutas. GGM facilmente fazia amigos para toda a vida. Vai relatando todos os pormenores que lhe foram ocorrendo, parecendo nunca ter momentos de escolha, apenas aceitando e adaptando-se, um produto do acaso. Em relação à escrita, GGM explica os autores que o influenciaram, como os conheceu, muitas vezes através de amigos. Relata a difícil busca do seu estilo, sempre desapegado de tudo já feito, não renegando as suas eternas dificuldades na ortografia e o seu vício fumador incontrolável. GGM teve os seus mestres ocasionais, muita gente o marcou, a muitas "sumidades" se juntou em inúmeras tertúlias. Sente-se a criatividade no ar, todos os momentos são de excepção, os melhores brilham.

Fica-se com a sensação que GGM não inventa nada, apenas descreve. Por vezes, relata o que todos já sabem e bem conhecem, mas fá-lo na sua maneira única, que faz parecer que tudo ocorre pela primeira vez ao lermos.





(ver mais)

quinta-feira, setembro 18, 2003

A heresia de falar sobre o Big Brother (2)


No post anterior sobre este assunto teci algumas considerações gerais sobre o Big Brother (BB) em geral e sobre a primeira edição, em especial. Vou alargar-me um pouco até ao momento actual.

A segunda e terceira edições registaram um interesse menor por parte do público. Foi fácil esquecer quem foram os concorrentes e até mesmo os vencedores das edições. A movimentação social em redor do programa diminuiu bastante em relação à primeira edição. O BB já não era o principal tema de conversa nos cafés, era só mais uma coisa sobre o que falar, a novidade já não existia, os concorrentes pareciam não ter o mesmo “carisma” dos anteriores, pareciam jogar a toda a hora, fúteis, sem chama. Era esta a visão de muitas pessoas, um pouco desiludidas com o BB.

Por outro lado, o número de concorrentes potenciais não parou de aumentar. Parecia que todos os jovens de Portugal queriam ir para dentro da casa, adquirir fama e passar pela experiência. E todos já sabiam o que iam passar, já tinham visto as edições anteriores e pensado no que fariam se estivessem lá dentro. Mas a frase que os participantes mais dizem é: «Só quem está lá dentro é que sabe.»

Ainda existiu um degradante BB dos famosos. Os concorrentes eram pessoas habituadas a fingir, a serem cínicas para as câmaras, com uma grande facilidade de jogarem com os outros e, para mim, bastante menos interessantes que as pessoas comuns. Teresa Guilherme ajudou à mediocridade do programa, com a uma prestação débil e comprometida.

O quarto e actual BB prometia ser a confirmação de uma morte lenta para o programa. Mas o BB apareceu diferente em algumas coisas, começando pela escolha dos participantes. Houve a clara opção de que fossem todos jovens e, especialmente nas mulheres, atraentes. “Eles iriam mostrar tudo”, sugerindo que iríamos ter as mais escaldantes cenas de sexo em horário nobre. E assim parecia, quando se formaram logo nos primeiros dias dois casais e outros pareciam encaminhados. Mas depois pareceram acalmar, e o BB parece entrar num rumo em certos aspectos semelhante aos anteriores.

As regras também mudaram, com a nomeação de um líder que nomeia alguém para sair e que fica incólume às nomeações. Mais um motivo de tensão, mas que terá de ser visto com ponderação, porque outras coisas menos aparatosas foram alteradas mas que poderão ter uma grande influência. O programa parece ter sido adaptado para que os concorrentes façam noitadas consecutivas e que o tal clima especial aconteça. As privações e regimes duros de outros BB parecem ter sido atenuadas. O álcool está disponível, os participantes são acordados mais tarde e não são sujeitos a duras provas físicas.

Actualmente a TVI utiliza o BB como joker na sua programação. Tenta obrigar-nos a assistir a todos os seus programas deprimentes, com várias edições do BB a horas inesperadas. Há que resistir a este assediamento. Repetindo o que já tinha dito, com todos os defeitos que o BB possa ter e certamente os tem, é infinitamente melhor que qualquer telejornal, telenovela ou série da TVI.

Gostaria ainda de voltar a este tema para falar de outros aspectos, em especial da noção que os participantes têm que o mundo é apenas aquela casa. Também gostaria de falar de alguns concorrentes, especialmente da Lara, que me parece ser uma mulher que suscita a dúvida sobre o que é a ética feminina – porque ela é simultaneamente a concorrente mais bela que apareceu em todos os BB e aquela que aparenta ter mais nível. Existe um colorido interessante com vários sotaques disponíveis, e gostaria ainda de falar do BB por dentro, na medida do possível.





(ver mais)

terça-feira, setembro 16, 2003

Tudo sobre arte em 10 lições (1)


Para quem não é artista, o fundamental é estar atento às palavras de Picasso:

Toda a gente quer atender a arte. E porque não tentar entender o canto dos passarinhos? Por que razão se pode amar a noite, as flores e tudo o mais à nossa volta, sem tentar compreender? Mas, no caso da pintura, as pessoas teimam em compreender. Se, pelo menos, tomassem consciência de que o artista trabalha sem interesse material e que ele próprio mais não é do que uma partícula insignificante do mundo, não se deveria dar-lhe mais importância do que as muitas e variadas coisas que nesta vida nos dão prazer sem que saibamos explicá-las.




(ver mais)

segunda-feira, setembro 15, 2003

Notas sobre humor (2) - O Exorcista


O humor também escolhe formas insólitas de se apresentar. Há uns tempos atrás fui ver a nova versão do filme “O Exorcista”. A plateia era composta na sua maioria por jovens adolescentes, de idades semelhantes à que eu tinha quando vi o filme pela primeira vez. Era um Portugal diferente, onde Deus ainda não tinha morrido completamente e o Diabo ainda tinha alguns bastiões. Era um filme que falava de coisas sérias, um sobrenatural religioso com várias ligações à memória colectiva da época.

Nos minutos iniciais apareceram os primeiros risos. Talvez fosse apenas uma reacção de nervosismo inicial, mas com o decorrer do filme as jovens almas iriam acalmar e talvez até se amedrontar, pensei. Mas nada disso, para eles o filme foi uma enorme paródia, uma festa geral. Nunca estive num filme em que mais gente se riu, onde as gargalhadas foram mais prolongadas e sonoras. Algumas pessoas mais velhas ficaram indignadas com aquilo, acharam uma falta de respeito e de educação. Eu achei tudo curioso, aquele riso era espontâneo, valia a pena dar-lhe atenção.

Tudo no filme é desajustado dos tempos modernos. Os planos utilizados não são apelativos, as roupas, carros e casas são antiquados, mas a grande diferença são os tempos. Os jovens estão habituados a coisas rápidas, a um fast food televisivo, planos de poucos segundos, e ali tudo era pausado, lentamente dramático. A própria temática do sobrenatural, religiosidade, demónios, já não impressiona ninguém. Não que as pessoas estejam mais evoluídas, porque acreditam mais que nunca em disparates, mas nada é levado a sério, é mais um passatempo, os aliens, a teoria da conspiração, os círculos nos campos de cereais, o esoterismo, o futuro em pedras preciosas ou nas borras do café no fundo da chávenas, tudo se leva na brincadeira. As novas gerações vêem o filme como um enorme divertimento.

Fico a pensar na qualidade da juventude. Eu percebi porque razão eles acharam tanta graça ao filme, mas eles não sentiam a outra densidade existente, não se conseguem adaptar. Ou é como eles conhecem ou então rejeitam e gozam. Juventude esclerosada? >






(ver mais)

quarta-feira, setembro 10, 2003

Sobre a cultura japonesa


João Eira questionou-me como comentava um post no Abrupto sobre cultura japonesa. O post é o seguinte:

Na não-ficção, comprei uma tradução francesa de Peter Handke, intitulada Autour du Grand Tribunal sobre os julgamentos do TPI em Haia, e um livro de Haruki Murakami intitulado Underground sobre os ataques com sarin no metro de Tóquio. Não sei se este livro é bom ou mau, mas o subtítulo "The Tokyo gas attack and the Japanese psyche" interessou-me, porque dificilmente tenho mais a impressão da alteridade cultural do que quando vejo qualquer coisa japonesa. Filmes, banda desenhada, anime, desenhos animados. Aquilo é outro mundo com um traço de sado-masoquismo e de violência muito alheio à cultura ocidental. Como não os percebo, interessam-me.

Sobre o post interessa-me falar sobre a estranheza com que se encara a cultura japonesa.

A cultura japonesa é influenciada muito pelo budismo e pelo xintoísmo. Estas "culturas" convivem muito bem mas são bem diferentes. O xintoísmo é uma religião animista sem fundador, originalmente sem escrituras sagradas, sem dogmas e até sem nome. O xintoísmo dá o ar exótico ao Japão, com os seus mitos, cerimónias, rituais, e também com as Tori, as famosas portas de madeira à entrada dos santuários, compostas por duas colunas suportadas por duas vigas. É a religião do povo e da cultura popular, da adoração ao monte Fiji. Mas em 1868 o imperador Meiji tornou o xintoísmo a religião nacional, com exaltação da raça japonesa e da divinização do imperador. O xintoísmo, assim deturpado e afastado da sua raiz popular, foi um dos principais responsáveis por levar ao Japão a um crescente envolvimento militar além fronteiras, que culminou na sua participação na segunda guerra mundial.

Mas isto é apenas uma parte da questão. O xintoísmo nunca se espalhou além das fronteiras do Japão, não é uma religião universal. Para os próprios japoneses, o xintoísmo é a religião das grandes cerimónias (casamentos, funerais, algumas cerimónias anuais) e das pequenas coisas que lhes passam despercebidas. Quase todos os xintoístas são ao mesmo tempo budistas. O budismo acabou por ser a filosofia que disse aos japoneses como viver em cada momento.

Ao falar de budismo japonês, muitos fazem imediatamente a associação ao zen. Tal precisa de esclarecimentos. O zen não foi a primeira forma de budismo no Japão, não é uma corrente nascida no Japão e nem sequer é a forma mais popular de budismo neste país. O budismo foi introduzido no Japão no século sexto, no que viria a tornar-se a escola da Terra Pura. Trata-se da forma de budismo que a grande maioria dos japoneses segue. É dada uma ênfase à devoção, às cerimónias, à leitura de sutras. Apesar do seu sucesso, a sua influência na cultura japonesa não foi tão grande como a do zen, como mostrou D. T Suzuki.

O zen ganhou forma na China com a chegada de Bodhidharma em 520 DC. Este monge indiano veio a tornar-se no primeiro patriarca do zen (Chan em chinês), criando uma nova corrente, que ao mesmo tempo era uma ruptura e uma renovação do budismo. O zen adaptou-se à cultura local, ao confucionismo e recolhendo elementos do tauismo. O zen é talvez a filosofia de vida mais simples e mais directa que foi descoberta. É a filosofia do aqui e do agora. Mas filosofia é um nome pouco adequado, é uma prática que põe a sua ênfase na meditação sentada - zazen. O zen só entrou no Japão cerca de 700 anos depois da "chegada de Bodhidharma ao oriente", quando na China já começava a existir um declínio desta prática. Em especial, Dogen foi o principal responsável por esta nova revitalização. O zen iria impregnar todos os domínios da sociedade japonesa. Cerca de 700 depois, o zen vem para o ocidente e começam a aparecer os primeiros mestres ocidentais no século XX.

Actualmente, o nome "Zen" é amplamente divulgado no ocidente. A palavra tem uma sonoridade agradável e misteriosa. Serve de nome a perfumes, bandas de rock, equipamento electrónico... Para outros, zen é algo misterioso e transcendente, usando a palavra para criar a ambiente e, presumem, algum requinte. Alguns mais esclarecidos já leram uns livros sobre o assunto e possuem uma curiosidade intelectual, conhecendo um pouco das artes zen, da poesia, dos jardins zen, da caligrafia, o teatro No, a tiro com arco, o arranjo floral, etc. Mas no zen é dada pouco importância ao conhecimento intelectual, a prática é o fundamental. Alguns experimentam umas sessões de zazen, mas a sua dureza fá-los desistir. E o zen nada dá, apenas tira, como disse uma vez o mestre Taissen Deshimeru a alguém que lhe perguntava o que lhe dava o zen.

Coisas que nos parecem muito evoluídas para nós, só ao alcance de espíritos eleitos, aparecem nos desenhos animados japoneses para crianças. Em pano de fundo existem conceitos como o vazio, o desprendimento, a mudança contínua, a evolução espiritual, o abandono do eu, o respeito pelos mestres. Pode ser subtil, muitas vezes vendo-se pelo que não se faz e não se diz e pela não ocorrência do mais esperado nem do menos esperado.

Os filmes, animações e bandas desenhadas japonesas parecem muitas vezes caóticas, violentos e com demasiada destruição. Mas aqui há alguns equívocos. A cultura japonesa tem muitos elementos de brutalidade mas não de violência, porque a sua herança é guerreira e não lutadora. A destruição em parte explica-se em muito pelos terramotos aos quais o país é frequentemente sujeito, talvez até mais que pelas bombas atómicas da segunda guerra mundial. Numa animação japonesa, em 5 minutos pode existir uma luta entre guerreiros, uma cena erótica, uma cómica, uma infantil, uma espiritual. Será isto caótico ou será que caóticas são as mentes que não conseguem absorver tudo isto? Trata-se de uma cultura que aceita aquilo que o homem é, aceita o corpo, aceita a criatividade, aceita os defeitos, as contradições.

Wenceslau de Morais foi um português que viveu e se encantou pelo Japão, depois de ter andado um pouco por todo o oriente sem sentir qualquer entusiasmo pelo que via. Os seus livros falam da alma japonesa. Recentemente, pessoas que conheço foram ao Japão. Disseram que se sentiram como em casa, talvez por conhecerem os fundamentos da cultura japonesa e a sua universalidade, muito mais importante que os pormenores exóticos. Compreender o Japão universal é algo essencial para os portugueses completarem a sua história.





(ver mais)

segunda-feira, setembro 08, 2003

Notas sobre humor (1) - Os nossos estudantes


O fenómeno do humor intriga-me. A sua omnipresença é contrastada pelo facto de nunca se discutir sobre o que é o humor, a sua função, efeitos, etc. Isto é estranho numa cultura em que tudo se disseca e nada pode ficar por explicar. Estas notas sobre o humor não pretendem fazer a luz sobre o assunto, servindo de estímulo a “pesquisas” sobre o humor que vou fazendo na retaguarda.

Coloco aqui algumas pérolas que os nossos estudantes responderam em exames nacionais. A minha fonte foi um programa da Antena 2. Não posso garantir a exactidão de cada palavra nem dar mais pormenores porque apenas me pude socorrer da memória.

Péricles foi o maior ditador da democracia grega.

Os egípcios inventaram a arte fúnebre para que os mortos pudessem viver melhor.

O maior problema dos países de terceiro mundo é a superabundância de
necessidades.

O nervo óptico é o músculo que leva ideias luminosas ao cérebro





(ver mais)

quinta-feira, setembro 04, 2003

Não há tempo para nada


Houve uma altura em que se dizia que apenas três pessoas no mundo inteiro compreendiam a teoria da relatividade de Einstein. Os tempos mudaram, agora o comum dos mortais já sabe que o tempo também é relativo, e daí o uso intensivo da expressão: "Não há tempo para nada".

O relógio engana-se, duas horas hoje em dia é bastante menos do que à trinta anos atrás. O curioso é que as mentes apressadas acabam por ser as mais lentas a obter resultados. Está isto relacionado com o tempo porque as mentes neuróticas não deixam “espaço” para o espírito se sentir liberto – e aí há tempo para tudo.





(ver mais)

quarta-feira, setembro 03, 2003

A heresia de falar do Big Brother


Muito antes início do primeiro Big Brother nacional já estava instalada uma polémica de opiniões definitivas. Andei um pouco alheado disso e só uns dias antes de iniciar o programa me inteirei sobre o que era. Parecia-me um pouco assustador colocar pessoas fechadas naquelas condições, sem privacidade e privados de tantas coisas a que estavam habituados. E tendo em conta o fraco domínio emocional das pessoas que (presumivelmente) seriam escolhidas, aquilo poderia ser uma experiência psicológica muito intensa e fria, por ser programada.

Enganei-me numa coisa e noutra acertei em parte. Não ia ser uma experiência fria e impessoal, como antevi (não tinha visto qualquer imagem dos programas em outros países). As pessoas entram na casa rodeadas pela família e amigos, os familiares estão semanalmente no programa, os participantes estão sempre cheios de saudades da família e dos amigos e, privados destes, tentam muitas vezes encontrar novos amigos e até formar nova família dentro da casa – deste ponto de vista, é um programa muito conservador, e uma boa propaganda aos valores familiares.

No que acertei em parte foi no ter pensado que seria uma experiência intensa. Já antevia que os jovens participantes, que se achavam bastante seguros de si, iriam ficar bastante desorientados face às privações impostas, perdendo facilmente o controlo e surpreendidos por verem que possuíam tão pouco auto conhecimento.

O que não antevia era a reacção no exterior. Surpreendi-me com o sucesso do programa, transversal a toda a sociedade e não apenas nas camadas habituadas a programas mais sentimentais. O sucesso explica-se de várias formas. A maioria fez isso falando da doentia necessidade das pessoas saberem da vida dos outros, em especial da intimidade. Mas o Big Brother também é um corte em relação ao que se vê na TV. Tudo o que aparece nos média é cuidadosamente preparado, a normalidade é excluída, as palavras e os gestos são encenados, exclui-se o que não é próprio, o que é demasiado mundano. E no Big Brother as pessoas aparecem como são e todas são diferentes e com várias facetas inesperadas – e humanas. Em particular, o primeiro Big Brother era mais intenso por os participantes irem bastante desprevenidos. Alguns já tinham visto edições em outros países e sabiam que iriam ter alguma notoriedade. Mas não imaginavam que fosse tanta até porque a TVI na altura era uma estação com pouca audiência, e para eles o mundo era só as pessoas da casa, daí o drama que era o ter de sair, como se fosse acabar algo de muito precioso. Para o espectador era intrigante saber que aquelas pessoas eram, naquele momento, as mais famosas do país mas sentiam-se tão sós e perdidas. Ainda surpreendente era ver que, aparentemente, os espectadores pareciam gostar muito de uns participantes e detestar outros. Mas quando vinham para exterior, todos os participantes foram quase sempre bem recebidos. Poderia divagar um pouco para tentar explicar isto com base nas expulsões e em sentimentos de culpa, mas tenho dúvidas se isto será bem assim.

Os críticos ferrenhos do Big Brother são um caso clínico em si. Não que o programa seja isento de críticas. Obriga os participantes a privações e humilhações várias, expondo toda a intimidade. E vende isto! Mas é paternalista estar preocupado com os participantes que entraram para lá de livre vontade e podiam desistir quando quisessem, o que chegou a ocorrer. Os efeitos nefastos do programa ao nível social que se previram pareceram-me bastante exagerados, face a outro tipo de programas já há muito existentes e “tradicionalizados”. Acho mesmo que o pior efeito do Big Brother foi indirecto, com a fixação de público na TVI e nos seus jornais, séries e telenovelas – programas que lançaram um véu negro no país, com promessas de depressão garantidas. Com isto quero dizer que acho muito pior qualquer destes programas que um Big Brother, que me pareceu funcionar também como terapia familiar e de grupo, juntando muitas pessoas desavindas para assistir juntas ao desfilar emocional.

Em relação às outras edições e em especial sobre esta última a decorrer, talvez acrescente mais umas palavras.



(ver mais)

terça-feira, setembro 02, 2003

A necessidade de ter sempre opinião


É frequente ver na TV, rádio, jornais, indivíduos dizerem que defendem ou defenderam tal posição. Com isto, parecem querer dizer que a opinião deles conta, que influenciam os destinos do mundo. Ou então, que eles, ao contrário na massa anónima estúpida e inculta, têm opiniões fortes e as defendem convictamente – e como corolário, merecem elogios, e só não os pedem porque são muito modestos.

Mas não será que esta necessidade de ter opinião sobre tudo, sempre bem definida, sem dúvidas para além das da praxe admitidas em abstracto, seja mais uma manifestação de um fraco carácter? Uma personalidade forte sabe conviver com a dúvida, com a incerteza, não precisa de estar sempre a catalogar tudo de forma doentia. Talvez só tenha voz nos média quem diga que tem opinião. E há que fazer a vontade a estes senhores porque são eles que mandam no mundo. Um mundo à imagem Deles.





(ver mais)

segunda-feira, setembro 01, 2003

Os portugueses e o amor



A un portugués que llorava
Preguntaran la ocasión.
Respondió que el corazón
Y que enamorado estava.
Por minorar su dolor
Le preguntaran «de quien?»
Respondió: «Pués de ninguén
Lloro de puro amor»

Poesia popular castelhana.




(ver mais)